A crítica musical brasileira não é tão ruim como se comenta. O que a tornou menos relevante atualmente, tem suas origens no início dos anos 70, como veremos. Mas como não reconhecer a competência e o profundo conhecimento de, por exemplo, José Ramos Tinhorão, cujo grande pecado é seu apego exacerbado ao passado e sua ojeriza às novidades, desde sempre? Sua especialidade é descobrir similaridades entre canções pops e obras do Renascimento ou de algum compositor erudito de séculos atrás. Fez muito isso contra o Tom Jobim. Outros especialistas dignos são o José Miguel Wisnik (excelente músico e escritor), Zuza Homem de Melo, Tárik de Souza, Ana Maria Baiana, nosso José Telles, o querido Nélson Mota e muitos outros. A verdade é que desde o aparecimento das grandes revistas de circulação nacional com seus críticos musicais, começaram a proliferar várias publicações especializadas em música pop nacional e estrangeira e, junto com elas, um sem número de jornalistas que em boa quantidade, se tornariam folclóricos até (para não dizer pior), que criaram certos paradigmas que para a grande maioria dos leitores e fãs, se tornou regras, leis. O engraçado é que poucos notavam que quase sempre esse pessoal se contradizia, se emaranhando nas próprias teias. Lembro bem que quando o “DOUBLE FANTASY” de Lennon/Yoko, tão logo foi lançado, um “mestre” do New York Times (salvo engano), caiu em cima. Chegou a dizer que John deveria ter permanecido aposentado, pois estava denegrindo toda sua obra anterior. Uma semana após o assassinato do ex-beatle, este mesmo jornalista escreveu que o disco era o melhor lançamento da década. Como à época os artistas usavam indumentárias “ripongas”, com longas madeixas e barbas de guru indiano, ai de quem fosse “bonito”! McCartney pagou caro por isso, mas quem sofreu às pencas foi o PETER FRAMPTON, coitado. O brilhante guitarrista, pianista, compositor e cantor, surpreendeu ao entrar nas paradas com um disco duplo ao vivo, “Frampton Comes Alive”, logo após deixar a obscura banda HUMPLE PYE. Um trabalho, hoje em dia, considerado antológico, porém a crítica foi impiedosa na ocasião: era “o cabelo do sovaco do cavalo do bandido”. Anos depois, careca e quietinho, saiu em excursão com David Bowie. Virou gênio, “guitar hero”. Outro pecado mortal era fazer sucesso de público e vendas. Chegar às paradas era algo ultrajante. A crítica adorava citar bandas e artistas que só ela conhecia, e que arrasavam, tocando num boteco do interior da Irlanda. Mas os caras só eram bons até algum produtor descobri-los e eles entrarem no “TOP TEN”. Milagrosamente viravam vendidos, lixo comercial. ELTON JOHN enquanto ralava como um discreto cantor/pianista era um “must”. Depois viraria o “cão do 7º livro”, quando “Your Song” e “Rocket Man” ganharam as rádios. Até os STONES, vistos como o “sagrado graal”, ousou com “ANGIE” ganhar disco de platina e... Pau neles! De fato, vivíamos um tempo em que muita gente boa e apreciada pelos “iniciados”, não tinha o espaço devido na mídia, enquanto muita baba e oportunistas de 3ª categoria monopolizavam o mercado, principalmente as trilhas de novelas, entretanto a crítica, que deveria saber separar o joio do trigo, parecia absurdamente reducionista: saiu-se bem? Então pau no lombo. E como mentiam... Não me esqueço do Ezequiel Neves alardeando que a Scarlet Moon teria passado a noite com um segurança de Bob Dylan. A sedução teria lhe valido uma exclusiva (entrevista, fique claro) com o mestre compositor. Outro fato mais que risível foi quando um crítico renomado então malhou Caetano pela pobreza dos versos de um trecho de “SÃO JOÃO, XANGÔ, MENINO”. Os versos? “olha pro céu meu amor/veja como ele está lindo”, escritos por Luiz Gonzaga/José Menezes. Na verdade, o baiano fez uma citação/homenagem ao Gonzagão. Discos do tipo “OS GRANDES SUCESSOS DE”, ou “O MELHOR DE” e coisas parecidas, eram severamente rejeitados e denegridos “sem choro nem velas”. Verdade que a grande maioria deles era produzida com intenções meramente comerciais, mas muitos funcionavam (e ainda funcionam), principalmente como “cartões de visitas” para aqueles que conheciam quase nada, ou mesmo nada, de um determinado artista ou grupo. Vale lembrar que nos primórdios do rock (e da MPB, blues, jazz, reggae etc.) as melhores e grandes canções daqueles gênios, eram lançadas em compacto-simples e “priu”. Passado o estouro, sumiam das prateleiras. Portanto, um álbum que reunisse todo aquele material era sempre bem-vindo. Afinal, quem não os tem? Contudo, os sacerdotes do bom gosto não aliviavam, adorando “fazer a cabeça” da molecada espinhenta e até de adultos. O supra-sumo da atuação desses portentosos especialistas se deu quando depois de 10 anos, McCartney saiu em excursão pelo mundo, reunindo seus sucessos solos com clássicos dos Beatles que jamais teria tocado ao vivo. Ao vir pela 1ª vez ao Brasil, foi “severamente criticado por ter feito isso”. Por sua vez, David Bowie, solicitou que os fãs enviassem suas listas com as músicas que gostariam de ouvi-lo executar e montou um excelente repertório de sucessos para rodar o mundo. Aqui chegando, logo após a apresentação (no mesmo período da visita de Paul) foi “severamente elogiado por ter feito isso”. Pela mesma revista, na mesma edição e pelo mesmo crítico. Coisas nossas... PS: “No Brasil, o sucesso é ofensa pessoal!” (TOM JOBIM). Por João Carlos Mendonça - abril/2014
segunda-feira, 28 de abril de 2014
“A CRÍTICA E OS GRANDES SUCESOS DE...” - Por JOÃO CARLOS MENDONÇA
A crítica musical brasileira não é tão ruim como se comenta. O que a tornou menos relevante atualmente, tem suas origens no início dos anos 70, como veremos. Mas como não reconhecer a competência e o profundo conhecimento de, por exemplo, José Ramos Tinhorão, cujo grande pecado é seu apego exacerbado ao passado e sua ojeriza às novidades, desde sempre? Sua especialidade é descobrir similaridades entre canções pops e obras do Renascimento ou de algum compositor erudito de séculos atrás. Fez muito isso contra o Tom Jobim. Outros especialistas dignos são o José Miguel Wisnik (excelente músico e escritor), Zuza Homem de Melo, Tárik de Souza, Ana Maria Baiana, nosso José Telles, o querido Nélson Mota e muitos outros. A verdade é que desde o aparecimento das grandes revistas de circulação nacional com seus críticos musicais, começaram a proliferar várias publicações especializadas em música pop nacional e estrangeira e, junto com elas, um sem número de jornalistas que em boa quantidade, se tornariam folclóricos até (para não dizer pior), que criaram certos paradigmas que para a grande maioria dos leitores e fãs, se tornou regras, leis. O engraçado é que poucos notavam que quase sempre esse pessoal se contradizia, se emaranhando nas próprias teias. Lembro bem que quando o “DOUBLE FANTASY” de Lennon/Yoko, tão logo foi lançado, um “mestre” do New York Times (salvo engano), caiu em cima. Chegou a dizer que John deveria ter permanecido aposentado, pois estava denegrindo toda sua obra anterior. Uma semana após o assassinato do ex-beatle, este mesmo jornalista escreveu que o disco era o melhor lançamento da década. Como à época os artistas usavam indumentárias “ripongas”, com longas madeixas e barbas de guru indiano, ai de quem fosse “bonito”! McCartney pagou caro por isso, mas quem sofreu às pencas foi o PETER FRAMPTON, coitado. O brilhante guitarrista, pianista, compositor e cantor, surpreendeu ao entrar nas paradas com um disco duplo ao vivo, “Frampton Comes Alive”, logo após deixar a obscura banda HUMPLE PYE. Um trabalho, hoje em dia, considerado antológico, porém a crítica foi impiedosa na ocasião: era “o cabelo do sovaco do cavalo do bandido”. Anos depois, careca e quietinho, saiu em excursão com David Bowie. Virou gênio, “guitar hero”. Outro pecado mortal era fazer sucesso de público e vendas. Chegar às paradas era algo ultrajante. A crítica adorava citar bandas e artistas que só ela conhecia, e que arrasavam, tocando num boteco do interior da Irlanda. Mas os caras só eram bons até algum produtor descobri-los e eles entrarem no “TOP TEN”. Milagrosamente viravam vendidos, lixo comercial. ELTON JOHN enquanto ralava como um discreto cantor/pianista era um “must”. Depois viraria o “cão do 7º livro”, quando “Your Song” e “Rocket Man” ganharam as rádios. Até os STONES, vistos como o “sagrado graal”, ousou com “ANGIE” ganhar disco de platina e... Pau neles! De fato, vivíamos um tempo em que muita gente boa e apreciada pelos “iniciados”, não tinha o espaço devido na mídia, enquanto muita baba e oportunistas de 3ª categoria monopolizavam o mercado, principalmente as trilhas de novelas, entretanto a crítica, que deveria saber separar o joio do trigo, parecia absurdamente reducionista: saiu-se bem? Então pau no lombo. E como mentiam... Não me esqueço do Ezequiel Neves alardeando que a Scarlet Moon teria passado a noite com um segurança de Bob Dylan. A sedução teria lhe valido uma exclusiva (entrevista, fique claro) com o mestre compositor. Outro fato mais que risível foi quando um crítico renomado então malhou Caetano pela pobreza dos versos de um trecho de “SÃO JOÃO, XANGÔ, MENINO”. Os versos? “olha pro céu meu amor/veja como ele está lindo”, escritos por Luiz Gonzaga/José Menezes. Na verdade, o baiano fez uma citação/homenagem ao Gonzagão. Discos do tipo “OS GRANDES SUCESSOS DE”, ou “O MELHOR DE” e coisas parecidas, eram severamente rejeitados e denegridos “sem choro nem velas”. Verdade que a grande maioria deles era produzida com intenções meramente comerciais, mas muitos funcionavam (e ainda funcionam), principalmente como “cartões de visitas” para aqueles que conheciam quase nada, ou mesmo nada, de um determinado artista ou grupo. Vale lembrar que nos primórdios do rock (e da MPB, blues, jazz, reggae etc.) as melhores e grandes canções daqueles gênios, eram lançadas em compacto-simples e “priu”. Passado o estouro, sumiam das prateleiras. Portanto, um álbum que reunisse todo aquele material era sempre bem-vindo. Afinal, quem não os tem? Contudo, os sacerdotes do bom gosto não aliviavam, adorando “fazer a cabeça” da molecada espinhenta e até de adultos. O supra-sumo da atuação desses portentosos especialistas se deu quando depois de 10 anos, McCartney saiu em excursão pelo mundo, reunindo seus sucessos solos com clássicos dos Beatles que jamais teria tocado ao vivo. Ao vir pela 1ª vez ao Brasil, foi “severamente criticado por ter feito isso”. Por sua vez, David Bowie, solicitou que os fãs enviassem suas listas com as músicas que gostariam de ouvi-lo executar e montou um excelente repertório de sucessos para rodar o mundo. Aqui chegando, logo após a apresentação (no mesmo período da visita de Paul) foi “severamente elogiado por ter feito isso”. Pela mesma revista, na mesma edição e pelo mesmo crítico. Coisas nossas... PS: “No Brasil, o sucesso é ofensa pessoal!” (TOM JOBIM). Por João Carlos Mendonça - abril/2014
Edu
Sensacional o texto e sensacional o vídeo de Odair José que caiu como uma luva!
ResponderExcluirO vídeo só poderei ver em casa!
ResponderExcluirBrilhante, João Carlos. A citação final do Tom me lembrou outra dele, em que dizia que o povo brasileiro prefere o Garrincha ao Pelé, porque o primeiro teve uma vida - e uma morte - sofridas, enquanto o segundo foi bem sucedido sob todos os aspectos.
ResponderExcluirSaudações
Pedro
Sensacional foi a resposta que Caetano deu ao crítico, kkkkk. "Você é burro, cara..."
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