A Postagem OS TEXTOS DAS CONTRA-CAPAS DOS DISCOS DOS BEATLES***** foi publicada em novembro do ano passado. Aqui, a gente confere novamente o texto sobre o Álbum Branco na contracapa do LP com a trilha de Yellow Submarine. Não deixe de conferir a postagem completa com os todos os textos que foram publicados nas capas de discos dos Beatles.
Uma das curiosidades bacanas que acompanhavam os primeiros álbuns dos Beatles, era que, a contra-capa trazia um texto explicativo – uma resenha – sobre cada um. Esses textos eram comerciais ao extremo, e de tão ingênuos para a época, chegavam a ser bobos e dispensáveis. Era uma prática comum, de uso quase obrigatório, os LPs (Long Plays) como foram batizados os discos de vinil de 10 polegadas no final dos anos 1940, trazerem um texto que tentasse atrair o consumidor de forma definitiva. Embora, cada vez com menos frequência, essa prática ainda perduraria por anos. Quando os Beatles apareceram, não foi diferente. Assim, os responsáveis pelos textos nas capas dos álbuns dos Fabs, eram feitos pelo assessor de imprensa de confiança, contratado por Brian Epstein. Tony Barrow foi o autor dos três primeiros: Please Please Me, With The Beatles e A Hard Day’s Night. Barrow foi o primeiro assessor de imprensa e publicitário dos Beatles. Foi ele que cunhou o indelével apelido “Fab Four” (quatro fabulosos) e ajudou a configurar a visão que o mundo tinha dos Beatles. E foi assim até a explosão de A Hard Day’s Night. Brian achou que os Beatles precisavam de um relações públicas que falasse diretamente ao mercado americano. Para Brian, Derek Taylor era "o cara". Barrow continuou colaborando com a Nems, mas também assessorava dezenas de outros artistas. Assim, coube a Taylor escrever o texto do próximo álbum, Beatles For Sale. A partir deste álbum, o uso desses textos foi se mostrando inútil e essa prática foi temporariamente encerrada. De forma que todos os álbuns seguintes dos Beatles (exceto Yellow Submarine) ficaram livres de carregarem esse fardo. Curiosamente, só no disco, que traz a trilha sonora do filme Yellow Submarine, lançado em 17 de janeiro de 1969, tornou a aparecer outro desses textos que, deveria ter sido escrito por Derek Taylor que acabou dando uma de joão-sem-braço e publicou uma crítica pronta de um tal Tony Palmer, do “London Observer” que, na verdade, era sobre o “Álbum Branco”. É importante nunca esquecer, que, como bem disse o amigo Valdir Junior na postagem sobre Tony Barrow, numa época distante onde ainda nem se imaginava sonhar com a internet e a informação era mínima, esses textos eram ouro! Aqui a gente confere o texto na íntegra, tal e qual foi publicado, sem correções ou atualizações de português.
“Meu nome é Derek, ou seja, como mamãe me chamava; de fato, não é um grande nome, exceto que é o meu próprio. Gostaria pois de dizer que fui convidado a tecer os comentários para o álbum “Yellow Submarine”. Derek Taylor ex-divulgador |unto à imprensa para os Beatles; ele o foi depois nos Estados Unidos, hoje, ao tempo destas notas, é o seu homem de imprensa para a América. Dêsse modo, quando foi convidado a escrever algumas notas para “Yellow Submarine” concluiu que não só não tinha nada de novo que dizer sobre os Beatles de quem também é ardoroso fã - como o fato de ser muito bem pago por êles não o deixava inteiramente livre para usar de raciocínio crítico imparcial. De qualquer forma, seu desejo mesmo era que o público que se deliciou com “Yellow Submarine” também fosse prestigiado com êste magnífico álbum. Dêsse modo, aqui temos: não comprado, não influenciado, sem retoques, desvinculado, puro e um tanto auspicioso, o comentário dêste álbum Apple/EMI, dos Beatles, por Tony Palmer, do “London Observer” - jornalista e cineasta de nomeada. O "ÔLHO-DE-BOI" DOS BEATLES - Se ainda resta dúvida sôbre serem Lennon e McCartney os expoentes máximos da criação musical desde Schubert, o lançamento dêste álbum vem significar uma varrida nos últimos vestígios de vaidade cultural e preconceito burguês com um dilúvio de composições que apenas os incultos deixarão de apreciar, e só os surdos dêle não se aperceberão. Traz o simples título de THE BEATLES (BTX 1005/6), num envoltório singelamente branco, cujo adôrno são os nomes das canções... e aquelas quatro faces, que para alguns representam a ameaça da juventude de cabelos longos; para outros, a luta desesperada e aparentemente sem fim contra aquêles cínicos — os chamados “superiores”. Nos olhos dos Beatles, bem como em suas criações, vislumbra-se, como num espelho, o frágil e fragmentário da sociedade que os patrocina, representa, interpreta, faz-lhes exigências, e os pune quando fazem o que os outros consideram errado. Paul, sempre esperançoso e pensativo; Ringo, sempre o filhínho da mamãe; George, o “terror local”, hoje “o bom rapaz”; john, ensimesmado, tristonho, mas possuidor de uma inteligência lúcida, não turbada pelo que a moralidade organizada lhe lança à conta. São êles os nossos legítimos heróis, e melhores do que merecemos. Não é como se os Beatles sempre visassem a tal louvor. A qualidade superior das 30 novas canções das alegrias simples da vida dêles. O lirismo de seus versos transborda em fulgurantes lampejos, e tal é seu magnetismo, que é impossível resistir-lhes. Quase tôdas as faixas se conduzem num crescendo; vividas, descuidadas, indiferentes, leves. O tema varia, desde porcos ("Você viu os mais rotundos leitões/ Em camisas brancas e engomadas”) até o teor daquele filme de sábado à tarde ("£le desistiu da caçada ao tigre com seu fuzil para elefante/Para o caso de acidente, sempre levava a mamãe”); desde (“Porque não o fazemos na estrada") até os (“Fungos comestíveis do Savoy"). A habilidade na orquestração desenvolve-se com precisão calculada. A orquestra inteira, metais, violino, carrilhão, saxofone, órgão, piano, cravo, todo tipo de percussão, flauta, efeitos sonoros; tudo com equilíbrio e, daí, com habilidade. Suprimiram-se, ou melhor, ignoraram- se dispositivos eletrônicos em favor da musicalidade. Referências ou cotações, desde Elvis Presley, Donovan, The Beach Boys e outros, são tecidas dentro duma aura que os tornou os “tapeceiros persas” da música popular. Está tudo aqui, apenas apure o ouvido. Lennon canta “Contei-lhes dos campos de morango” e “Falei-lhes do tôlo lá na colina" — o que resta? Os Beatles são antes habilidosos que virtuosos instrumentistas. Sua execução conjunta, porém, é intuitiva e admirável. Eles dobram e retorcem ritmos e frases musicais, com aquela unânime liberdade que dão às suas aventuras harmônicas; o frenesi da expectativa e do imprevisível. As vozes — e a de Lennon em particular «*- são mais um instrumento: lamentoso, estridente, zombeteiro, choroso. Há uma tranqüila determinação de escaparem da falsa intelectualização que usualmente os cerca e à sua música. A letra é quase sempre deliberadamente simples — assim é a composição Aniversário, que encerra versos como “Feliz aniversário para você"; outra em que é repetido “Boa-noite"; ainda outra expressa: “Estou tão cansado, não consegui pregar o ôlho". A música é, igualmente, despojada de tudo, exceto da mais pura harmonia e ritmo — de sorte que aquilo que resta é um prolífico jôrro de melodia, criação musical de inequívoca clareza e beleza. A ironia e mordacidade que têm emprestado à sua música uma dificuldade e um limite, ainda está borbulhante — “Lady Madonna tentando viver dentro de suas posses — sim/Olhando através de óculos de cebola". A severidade de imaginação é ainda um tanto mais dura: “A águia bica meu ôlho/O verme que corrói meu osso”. “Nuvens negras, negros pássaros; asas partidas, lagartos, destruição". E a mais grotesca, uma extraordinária faixa que se chama apenas Revolução 9 e encerra efeitos de som, murmúrios ouvidos ao a£aso, formalismo retrógrado, sons discordantes de lembranças subconscientes de uma civilização que se debate. Cruel, paranóica, inflamada, agonizante, sem esperança, é-lhe dada forma pôr meio de uma voz anônima de bingo, que apenas segue repetindo: “Número nove, número nove, número nove”, até que você sente vontade de gritar. A melancolia acumulada reflete-se inteiramente em suas maneiras, como um véu purpúreo de irreal otimismo — fulgurante, inacessível, afetuoso. Por fim, tudo o que você tem a fazer é levantar-se e aplaudir. Qualquer que seja a medida do seu gôsto da música popular, você o satisfará aqui. Se julga qife música popular é Engelbert Humperdinck, creia, os Beatles foram um pouco mais além — sem sentimentalismos, mais apaixonadamente. Se pensa que o popular é rock’n'roll, saiba que êles o aprimoraram ainda — nas praias distantes da imaginação, ainda não palmilhadas por outros. Este álbum lhes consumiu cinco meses para o preparo, e, para o caso de você achar que foi muito lento, saiba que desde sua conclusão até a data destas linhas compuseram outras 15 canções. Nem mesmo Schubert trabalhou nesse ritmo.
“Meu nome é Derek, ou seja, como mamãe me chamava; de fato, não é um grande nome, exceto que é o meu próprio. Gostaria pois de dizer que fui convidado a tecer os comentários para o álbum “Yellow Submarine”. Derek Taylor ex-divulgador |unto à imprensa para os Beatles; ele o foi depois nos Estados Unidos, hoje, ao tempo destas notas, é o seu homem de imprensa para a América. Dêsse modo, quando foi convidado a escrever algumas notas para “Yellow Submarine” concluiu que não só não tinha nada de novo que dizer sobre os Beatles de quem também é ardoroso fã - como o fato de ser muito bem pago por êles não o deixava inteiramente livre para usar de raciocínio crítico imparcial. De qualquer forma, seu desejo mesmo era que o público que se deliciou com “Yellow Submarine” também fosse prestigiado com êste magnífico álbum. Dêsse modo, aqui temos: não comprado, não influenciado, sem retoques, desvinculado, puro e um tanto auspicioso, o comentário dêste álbum Apple/EMI, dos Beatles, por Tony Palmer, do “London Observer” - jornalista e cineasta de nomeada. O "ÔLHO-DE-BOI" DOS BEATLES - Se ainda resta dúvida sôbre serem Lennon e McCartney os expoentes máximos da criação musical desde Schubert, o lançamento dêste álbum vem significar uma varrida nos últimos vestígios de vaidade cultural e preconceito burguês com um dilúvio de composições que apenas os incultos deixarão de apreciar, e só os surdos dêle não se aperceberão. Traz o simples título de THE BEATLES (BTX 1005/6), num envoltório singelamente branco, cujo adôrno são os nomes das canções... e aquelas quatro faces, que para alguns representam a ameaça da juventude de cabelos longos; para outros, a luta desesperada e aparentemente sem fim contra aquêles cínicos — os chamados “superiores”. Nos olhos dos Beatles, bem como em suas criações, vislumbra-se, como num espelho, o frágil e fragmentário da sociedade que os patrocina, representa, interpreta, faz-lhes exigências, e os pune quando fazem o que os outros consideram errado. Paul, sempre esperançoso e pensativo; Ringo, sempre o filhínho da mamãe; George, o “terror local”, hoje “o bom rapaz”; john, ensimesmado, tristonho, mas possuidor de uma inteligência lúcida, não turbada pelo que a moralidade organizada lhe lança à conta. São êles os nossos legítimos heróis, e melhores do que merecemos. Não é como se os Beatles sempre visassem a tal louvor. A qualidade superior das 30 novas canções das alegrias simples da vida dêles. O lirismo de seus versos transborda em fulgurantes lampejos, e tal é seu magnetismo, que é impossível resistir-lhes. Quase tôdas as faixas se conduzem num crescendo; vividas, descuidadas, indiferentes, leves. O tema varia, desde porcos ("Você viu os mais rotundos leitões/ Em camisas brancas e engomadas”) até o teor daquele filme de sábado à tarde ("£le desistiu da caçada ao tigre com seu fuzil para elefante/Para o caso de acidente, sempre levava a mamãe”); desde (“Porque não o fazemos na estrada") até os (“Fungos comestíveis do Savoy"). A habilidade na orquestração desenvolve-se com precisão calculada. A orquestra inteira, metais, violino, carrilhão, saxofone, órgão, piano, cravo, todo tipo de percussão, flauta, efeitos sonoros; tudo com equilíbrio e, daí, com habilidade. Suprimiram-se, ou melhor, ignoraram- se dispositivos eletrônicos em favor da musicalidade. Referências ou cotações, desde Elvis Presley, Donovan, The Beach Boys e outros, são tecidas dentro duma aura que os tornou os “tapeceiros persas” da música popular. Está tudo aqui, apenas apure o ouvido. Lennon canta “Contei-lhes dos campos de morango” e “Falei-lhes do tôlo lá na colina" — o que resta? Os Beatles são antes habilidosos que virtuosos instrumentistas. Sua execução conjunta, porém, é intuitiva e admirável. Eles dobram e retorcem ritmos e frases musicais, com aquela unânime liberdade que dão às suas aventuras harmônicas; o frenesi da expectativa e do imprevisível. As vozes — e a de Lennon em particular «*- são mais um instrumento: lamentoso, estridente, zombeteiro, choroso. Há uma tranqüila determinação de escaparem da falsa intelectualização que usualmente os cerca e à sua música. A letra é quase sempre deliberadamente simples — assim é a composição Aniversário, que encerra versos como “Feliz aniversário para você"; outra em que é repetido “Boa-noite"; ainda outra expressa: “Estou tão cansado, não consegui pregar o ôlho". A música é, igualmente, despojada de tudo, exceto da mais pura harmonia e ritmo — de sorte que aquilo que resta é um prolífico jôrro de melodia, criação musical de inequívoca clareza e beleza. A ironia e mordacidade que têm emprestado à sua música uma dificuldade e um limite, ainda está borbulhante — “Lady Madonna tentando viver dentro de suas posses — sim/Olhando através de óculos de cebola". A severidade de imaginação é ainda um tanto mais dura: “A águia bica meu ôlho/O verme que corrói meu osso”. “Nuvens negras, negros pássaros; asas partidas, lagartos, destruição". E a mais grotesca, uma extraordinária faixa que se chama apenas Revolução 9 e encerra efeitos de som, murmúrios ouvidos ao a£aso, formalismo retrógrado, sons discordantes de lembranças subconscientes de uma civilização que se debate. Cruel, paranóica, inflamada, agonizante, sem esperança, é-lhe dada forma pôr meio de uma voz anônima de bingo, que apenas segue repetindo: “Número nove, número nove, número nove”, até que você sente vontade de gritar. A melancolia acumulada reflete-se inteiramente em suas maneiras, como um véu purpúreo de irreal otimismo — fulgurante, inacessível, afetuoso. Por fim, tudo o que você tem a fazer é levantar-se e aplaudir. Qualquer que seja a medida do seu gôsto da música popular, você o satisfará aqui. Se julga qife música popular é Engelbert Humperdinck, creia, os Beatles foram um pouco mais além — sem sentimentalismos, mais apaixonadamente. Se pensa que o popular é rock’n'roll, saiba que êles o aprimoraram ainda — nas praias distantes da imaginação, ainda não palmilhadas por outros. Este álbum lhes consumiu cinco meses para o preparo, e, para o caso de você achar que foi muito lento, saiba que desde sua conclusão até a data destas linhas compuseram outras 15 canções. Nem mesmo Schubert trabalhou nesse ritmo.
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