Voltam à tona as mágoas da dupla mais famosa do mundo
Matéria publicada na revista Afinal, em 12 de novembro de 1985 - Por Sérgio Vaz
Eles sempre lavaram a roupa suja em suja em público. Embora, é claro, de maneiras diferentes: cada um seguia seu temperamento e sua personalidade. Paul McCartney, o mais reservado, mais calmo, mais suave, foi o primeiro a oficializar o fim da união que durou 14 anos: em 1970, ao lançar seu primeiro disco solo – antes mesmo do lançamento de Let It Be, o último LP dos Beatles – ele explicou que a dissolução do conjunto de música popular mais famoso do mundo se devia a “diferenças pessoais, diferenças musicais e diferenças empresariais”. John Lennon, o mais extrovertido, mais rebelde, mais amargo, dedicou cinco minutos e meio de seu LP Imagine, de 1971, a atacar violentamente seu ex-amigo e co-autor, com ele, de cerca de 180 canções, várias das quais unanimemente reconhecidas como das melhores da música popular em todo o século: “Uma cara bonita pode durar pode durar um ano ou dois, mas daqui a pouco vão ver o que você é capaz de fazer. O som que você faz é muzak aos meus ouvidos. Você deveria ter aprendido alguma coisa durante todos aqueles anos. Como você dorme à noite?” (Muzak é música tola, superficial, emasculada, repetitiva).
Suavidade – Paul McCartney respondeu a esse soco na cara a seu modo – suavemente. “Algumas pessoas conseguem dormir à noite achando que o amor é uma mentira. Algumas pessoas jamais compreendem”, disse ele, na canção Some People Never Know, do mesmo ano de 1971. Cinco anos mais tarde, ele voltaria ao assunto, em Silly Love Songs: “Você pensa que as pessoas já se cansaram de tolas canções de amor. Algumas pessoas querem encher o mundo com tolas canções de amor – e qual é o problema?”
Extremamente reveladora das diferentes complementares personalidades de cada um, a forma pela qual John Lennon e Paul McCartney se atacaram em suas músicas, depois do final de uma parceria e de um intenso e caloroso convívio, era a mesma nos contatos com a imprensa. Lennon jamais deixou de criticar abertamente as atitudes de Mccartney, seu casamento, a quantidade de filhos que teve (na verdade, apenas três); Paul, ao contrário, sempre foi discreto ao falar de John, preferindo repetir que tentou todo o possível para impedir o fim da parceria e dos próprios Beatles.
Assim, não é de se estranhar a intensa e imediata repercussão que teve a publicação, no último número da revista mensal inglesa Woman, lançado semana passada, de uma entrevista em que McCartney chama Lennon de “porco intrigante”. “Ele era capaz de ser um porco intrigante, o que nunca ninguém compreendeu. Desde a sua morte ele se transformou num Martin Luther Lennon”, acrescentou, numa referência a Martin Luther King, o pastor que lutou pelo fim da segregação racial nos Estados Unidos e foi – como o próprio Lennon – assassinado. “Mas isso não tem nada a ver com o que ele era realmente. John sempre foi mostrado como o bom moço dos Beatles, e eu o bastardo que destruiu o conjunto. Não era verdade. Ninguém nunca percebeu o hipócrita que Lennon era. Ninguém nunca falou das vezes em que ele me magoou. Por várias vezes ele disse que minhas músicas eram horríveis. In My Life foi escrita por mim, mas ele dizia ser dele. Durante dez anos ele escondeu minhas canções. John estava sempre pensando que eu o trapaceava ou estava sendo desonesto. Dei-lhe tudo e não obtive nada em troca.”
FORA DO CONTEXTO – De Nova York, onde mora, a viúva de John, Yoko, disse estar “profundamente chocada”, e pediu mais tempo para analisar a entrevista de Paul antes de fazer maiores comentários. Em Londres, um dos agentes de Paul apressou-se a procurar os jornalistas para esclarecer que todas as declarações publicadas foram feitas quatro anos atrás, e estão “fora do contexto”. De fato, Paul disse tudo isso em 1981 a Hunter Davies, o autor ainda na década de 60, da única biografia autorizada dos Beatles; Davies, o entrevistou por telefone recolhendo material para uma nova edição da biografia, revista atualizada, a ser lançada no mês que vêm. O porta-voz transmitiu a seguinte declaração de Paul: “Quero deixar claro que John Lennon não era nenhum santo, mas que eu, como milhões de pessoas, gostava profundamente dele”.
Nem era necessário dizer. Ao longo de todo o tempo, eles sempre exibiam publicamente – cada um a seu modo – suas diferenças, sua admiração e, em especial, a dor pela separação. Em Here Today, a música que compôs em 1982 para o amigo morto – depois, portanto, das declarações divulgadas agora – Paul, o reservado: “E agora não prendo mais lágrimas – eu amo você”.
Sinto falta do "manda mais!".
ResponderExcluirEsses dois eram os típicos melhores amigos. Eles se amavam mas se odiavam ao mesmo tempo. Creio que não se davam perfeitamente bem principalmente pela diferença de personalidade existente entre os dois.
ResponderExcluirBjs
Rafa
rafadeoliveira-tudosobrequalquercoisa.blogspot.com
Aham!
ResponderExcluirEssa matéria é mais um presentaço do Baú.Não tinha lido.Todavia lembro de Paul falar que Lennon "às vezes" se comportava como um porco manipulador.
ResponderExcluirQue o reconhecia como um grande artista,grande pessoa mas não era um santo.Curiosamente,se atentarmos,após o final da banda Paul nunca julgou nenhum dos companheiros.Mas foi vítima até do George.Aliás,ambos malhados por John.Também,o inseguro Lennon com Yoko num ouvido e Klein no outro...
PS: Prá não perder o costume "manda mais!".
Isso é muito bom! Eu amo esse Baú!
ResponderExcluirAcho que essas entrevistas na época eram um pouco distorcidas pela imprensa que adora ver o circo pegar fogo.
ResponderExcluirAcho que o Paul só quis mostrar que o John era ´´ bem humano `` ao contrario do que a Yoko gosta de mostrar e a maioria das pessoas imaginam dele com um ´´ santo ``
Concordo com o pessoal. John e Paul são o Tom e Jerry da vida real.
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