"The Beatles - A Biografia", de Bob Spitz, é um relato minucioso e detalhado não só sobre a carreira, mas principalmente sobre a vida dos Beatles. Foi lançado aqui no Brasil em 2007, quando eu comprei o meu e depois saiu uma 2ª edição em 2013. É um calhamaço enorme com nada menos que 984 páginas e pesa 1 tonelada (rsrs). Esse texto que a gente confere a seguir é um pedacinho do capítulo "Uma vez na América".
Naquela manhã, a multidão de 4 mil fãs foi até Heathrow para ver os rapazes, enquanto
músicas dos Beatles “reverberavam pelo sistema de comunicação do aeroporto”.
Foi uma visão estimulante quando surgiram na pista do aeroporto, bonitos e
sorridentes em seus novos ternos de pêlo de cabra angorá talhados em Londres
por Dougie Millings, com base em uma série de esboços de Paul. Para executar a
coreografia de última hora criada por Brian Epstein, eles pararam a menos da
metade do trajeto até o avião, viraram-se e acenaram ao mesmo tempo, olhando
para o terraço de observação, que estava tomado por faixas de encorajamento e
repleto de adolescentes que vibravam, gritavam e se equilibravam precariamente
sobre os parapeitos. Os Beatles riram e gritaram de volta para eles, contagiados.
Era impossível não sentir a animação, o apoio fiel de seus leais fãs a torcer
por eles, orgulhosos pelo fato de os Beatles estarem indo para os Estados
Unidos. Não havia “nada igual no mundo”, de acordo com Paul.
Brian, sutil como um diplomata, havia acomodado o grosso dos acompanhantes na
classe econômica do Boeing 707, onde os menos refinados não poderiam incomodar
os Beatles. George, em especial, queria ficar em paz; ele estava lutando contra
uma fraqueza que os rapazes inicialmente pensaram ser ansiedade, mas que estava
se desenvolvendo progressivamente em forma de gripe. Além disso, havia muitos
“clandestinos” a bordo — industriais britânicos que compraram passagens no vôo
101 para assediar os Beatles com propostas mirabolantes de negócios. Desde a
decolagem, eles não paravam de mandar repetidamente uma aeromoça até a primeira
classe para exibir produtos variados com propostas de merchandising. E não se
cansavam de surpreender os rapazes com a infinidade de bugigangas baratas que
já estava sendo produzida para ganhar dinheiro com o nome deles: lanternas,
relógios, casacos, travesseiros, cachecóis, canetas, braceletes, jogos e vários
tipos de perucas, que imitavam os cabelos dos Beatles e se tornaram um modismo
bobo. Aquela era a oportunidade para aumentar ainda mais o rol de bobagens.
Conforme o avião, taxiava, os Beatles se espremeram junto às janelas para ter uma
visão melhor da cena que se desenrolava no terminal. Todos os lugares para onde
olhavam estavam repletos de jovens. Gritos e aclamações irromperam dentro do
avião, e pela primeira vez desde Londres o rosto de John se iluminou com um
sorriso. “Olhe só pra isso!”, sussurrou um deles roucamente, com a voz lutando
entre o alívio e a alegria. Fãs americanos estavam se concentrando ali desde o
início da manhã, motivados pelos mais famosos radialistas de Nova York - que
transmitiam ao vivo do aeroporto. Durante o dia todo eles instigaram os fãs a
irem até lá, tocando discos dos Beatles ininterruptamente e, oferecendo
prêmios e perucas do penteado dos Beatles, casacos e fotografias. Como
resultado, conseguiram recrutar a maior multidão que o Kennedy International
Airport já reunira. “Nem para reis ou rainhas se viu nada igual”, disse um
policial do portão. O New York Times relatou que “três mil, adolescentes
ficaram em quatro fileiras na galeria superior da área de desembarque
internacional (...) garotas, garotas e mais garotas”. Do avião era possível vê-las
pulando, indóceis, muito parecidas com suas equivalentes britânicas. A polícia,
usando cada homem disponível, formou cordões de isolamento para tentar conter
as jovens, mas, quando o avião desligou os motores, a batalha parecia perdida.
Por vezes, alguma garota mais corajosa se atirava sobre a parede de uniformes
azul-marinhos — como um atacante de futebol americano em direção à meta - e era energicamente repelida. Uma espectadora
mais velha sofreu um leve ataque do coração, e, de acordo com o Daily News,
“alguns socos foram trocados enquanto as fãs lutavam pelos melhores lugares”.
Quando os rapazes chegaram à porta da aeronave, sorriram e gritaram para a multidão,
acenando aleatoriamente; um radialista sem fôlego se esforçou para descrever
suas expressões: “Até onde posso ver, os quatro Beatles estão na porta da
aeronave, e é quase certo que se encontram completamente estupefatos. Ninguém, ninguém
mesmo, nunca viu ou suspeitou algo sequer remotamente parecido ao que estamos
vendo!”
Por questões de segurança, os Beatles foram liberados de passar pela alfândega
e seguiram diretamente para a entrevista coletiva de imprensa no saguão térreo
da seção de desembarque da Pan Am. Mais de duzentos repórteres e fotógrafos
tomavam a sala, acotovelando-se na disputa por lugares e disparando perguntas
até quando os rapazes já estavam sendo levados para a saída, vestidos com seus
sobretudos pretos idênticos e carregando as bagagens de mão.
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