segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

THE BEATLES - A ÚLTIMA TURNÊ BRITÂNICA E O ÚLTIMO SHOW EM LIVERPOOL*****


Há 54 anos, no dia 12 de dezembro de 1965, os Beatles encerraram a última excursão que fizeram pelo Reino Unido com dois shows em Cardiff. O último show dos Beatles em Liverpool, sua terra natal, aconteceu no dia 5 de dezembro de 1965. Ninguém – talvez nem eles próprios – sabia que aquela seria a última vez que a cidade veria uma apresentação de seus filhos mais ilustres.
A última turnê britânica dos Beatles aconteceu entre os dias 3 e 12 de dezembro de 1965, com 18 shows por nove cidades em toda a Inglaterra, Escócia e País de Gales. Coincidiu com o lançamento do fantástico Rubber Soul, e do single duplo lado A com "Day Tripper" e "We Can Work It Out". Na manhã do dia 2 de dezembro de 1965 (um dia antes do lançamento de Rubber Soul). Eles partiram rumo à Escócia numa limousine conduzida pelo seu chofer Alf Bicknell, na época com 37 anos. Além dos quatro, o veículo levava também Neil Aspinall, um dos dois fiéis escudeiros. O outro, Mal Evans, provavelmente já estava lá, pois viajara na noite anterior em uma van com sete guitarras, a bateria e os amplificadores, deixando para os Beatles somente os violões que usavam para ensaiar e compor. No caminho para a Escócia para o primeiro show, uma Gretsch Country Gentleman de Harrison caiu da van e foi destruída por um caminhão, deixando-o com duas guitarras para a turnê.
Os Beatles tinham pela frente 560 quilômetros até o norte da Inglaterra, onde parariam para passar a noite antes de continuar até a Escócia para fazer o primeiro dos dezoito shows da turnê britânica de 1965.
O roteiro era o seguinte: No dia 3 de dezembro, fariam dois shows em Glasgow no Odeon Cinema; No dia 4, dois shows em Newcastle no Newcastle City Hall; No dia 5, dois shows em Liverpool no Empire Theatre; No dia 7, dois shows em Manchester no Ardwick ABC Cinema; No dia 9, dois shows em Birmingham no Odeon; No dia 10, dois shows em Londres no Hammersmith Odeon; no dia 11, mais dois shows em Londres no Odeon Astoria e encerrariam a turnê no dia 12 com dois shows em Cardiff no Capitol Cinema.
A principal fonte para esse texto (em vermelho) que a gente confere a seguir, foi compilado e editado tendo como base o excelente e fundamental (e ainda encontrável) livro do pesquisador Steve Turner, “1966 – o Ano Revolucionário”, lançado aqui no Brasil em 2106 pela Editora Benvirá. Outras fontes foram: "Paul McCartney - Uma vida" de Peter Ames Carlin"The Beatles - A Biografia" de Bob Spitz; "O Diário dos Beatles" de Barry Miles e "Os Anos da Beatlemania" dos brasileiros Ricardo Pugialli e Marcelo Fróes. Além da internet, claro.
De início, não havia planos para uma turnê de fim de ano no Reino Unido, porque os Beatles fariam um filme na Espanha para a Pickfair Eilms Limited, uma empresa de Brian Epstein, empresário deles, e de George “Bud” Ornstein, ex-chefe de produção da United Arlists. Esta filmagem acabou sendo postergada e isso permitiu que uma curta turnê fosse agendada, a primeira no Reino Unido em um ano. Em comparação às turnês de hoje em dia, que envolvem meses de ensaios, containeres cheios de equipamentos, luzes, montagem de palco complexa, equipes de segurança, centenas de técnicos, serviço de bufê, assistentes, motoristas e gerentes de mídia, a turnê britânica dos Beatles em 1965 parece bastante primitiva. A equipe inteira que os acompanhou na estrada era composta por Mal Evans, Neil Aspinall, Brian Epstein, o relações públicas Tony Barrow e o motorista Alf Bicknell. Eles chegaram a Berwick-upon-Tweed, em Northumberland, cinco quilômetros ao sul da fronteira escocesa, acobertados pela escuridão, e fizeram o check-in para passar a noite no King’s Arms Hotel, uma estalagem do século XVIII próxima ao rio no centro da cidade. No dia seguinte, os Beatles dormiram até tarde, tomaram café da manhã no quarto e saíram na hora do almoço com casacos pretos gros­sos sobre paletós e blusas de gola rolê. Então partiram de Berwick rumo a Glasgow sob uma chuva torrencial, uma viagem de 210 quilômetros.
Em Glasgow, ficaram no Central Hotel, na Gordon Street e deram a primeira coletiva de imprensa da turnê no Odeon Cinema onde fariam os shows.
Assim como em toda a turnê, em Glasgow os Beatles também fizeram dois shows noturnos e tiveram quatro grupos de abertura: Moody Blues (com Denny Laine, que mais tarde entraria para o Wings), Paramenmts (cujo tecladista, Gary Brooker, formaria o Procol Harum, Marionettes e os Koobas, de Liverpool. No dia seguinte percorreram mais 240 quilômetros até Newcastle, onde se hospedaram no Royal Turk’s Head Hotel.
Os shows em Newcastle foram notáveis não por causa dos tumultos nem pelos desmaios de fãs, mas pela chuva de balas de goma e “gonks” (bonequinhos ovais com cabelos arrepiados que estavam na moda na época) arremessados no palco.


Entre os shows os Beatles jantaram e de­ram uma entrevista ao jornalista local Philip Norman que bem mais tarde escreveria para o Sunday Times e se tornaria um renomado biógrafo de John Lennon e Paul McCartney.
Quando o segundo show acabou, eles voltaram para a sala de TV para assistir à peça The Parafffin Season de Donald Churchill, na série Armchair Theatre, que pouco tempo antes ti­nha sido retirada de seu cobiçado horário no domingo à noite. Os hotéis nessa época raramente forneciam TV, e uma das estrelas do The Season, o ator de Liverpool Norman Rossington, tinha atuado com os Beatles no ano anterior em Os reis do iê iê iê (em que interpretou o empresário do grupo, Norm). De acordo com Alan Smith (jornalista do NME que cobriu toda a turnê), foi uma noite tranquila, e todos os ga­rotos voltaram para o hotel depois do show. De acordo com outra fonte, pelo menos alguns ficaram acordados até tarde, na farra com o Moody Blues e escutando LPs do Isley Brothers e do B.B. King.
No dia seguinte, os quatro levantaram tarde e só foram para Liverpool depois das 13h. Nenhuma outra cidade britânica teve os Beatles por tanto tempo. Desde a primeira encarnação do grupo em 1957, eles tinham feito mais de 500 apresentações em Liverpool. Tios, tias, amigos de escola, pais e primos ainda moravam lá, assim como muitos dos fãs fiéis a eles na época em que tocavam covers e sonhavam com o estrelato internacional. “Liverpool é nossa casa”, disse John. “Como todo mundo nos conhece, esperam que a gente toque bem, e nós ficamos nervosos”.
Os dois shows que fizeram no Empire Theatre seriam os últimos que os Beatles fizeram em Liverpool. O Empire foi importante em momentos-chave da carreira de­les. Foi lá que Paul e George viram o show do quarteto vocal Crew-Cuts em setembro de 1955, e onde Paul fez fila diante do palco para pegar autógrafos. Foi ali que John se apresentou (sem sucesso) com o Quarry Men para o caça-talentos Carroll Levis em 1957. Foi também nesse local que John, Paul e George se apresentaram como Johnny and the Moondogs para o mesmo Levis em 1959. Em outubro de 1962, este foi o palco do primeiro grande show em teatro deles, num evento que tinha Little Richard como atração principal. Em dezembro de 1963, eles tocaram ali para membros do fã-clube num evento especial vespertino como parte do que seria transmitido na TV pela BBC como IT’S THE BEATLES.No dia do último compromisso do grupo em Liverpool, aconteceu algo meio estranho: eles foram abordados por fãs que faziam cam­panha para evitar o fechamento do Cavern, a casa de shows que ficava num porão perto das docas onde os quatro tinham feito quase 300 shows no início da carreira. A prefeitura exigia a modernização das instalações sanitárias e de esgoto, porém o dono não tinha como arcar com os custos.
Os Beatles não estavam dispostos a bancar um negócio à beira da falên­cia. Nessa época, ainda não havia uma indústria turística na cidade volta­da para os Beatles, e ninguém pensava em placas comemorativas, tombamento nem em envolvimento da National Trust. Foi Paul quem sugeriu que o espaço poderia ser transformado numa atração local, enquanto John anunciou: “A gente não acha que deve nada físico ao Cavern". Dois meses depois, a casa fechou e, apesar de ter funcionado de novo por um curto período, foi aterrada e ocupada por um estacionamento no ende­reço em que ficava em 1973.
Assim como nos shows em GIasgow o nível do entusiasmo dos fãs em Liverpool era difícil de calcular: o policiamento cuidadoso conteve tumultos nas ruas como nos anos anteriores, e a contagem de desmaios (meros 17 em um público total de 5 mil) fez a imprensa noticiar que a plateia ficou menos histérica, mas os gritos e a dança frenéticos persistiram, O barulho era alto o bastante para que Paul perguntasse ansioso se sua voz estava sendo captada pelos microfones e para que Ringo comentasse depois: “Vocês ouviram. Vocês viram. Essa é a resposta aos idiotas que falam que os Beatles estão em decadência”. Ainda assim, Alan Smith escreveu no New Musical Express: “Até em casa, na cidade de Liverpool, notei uma reação um pou­co mais tranquila da plateia em comparação com shows anteriores. Não estou criticando de maneira nenhuma, só acho que os fãs do grupo estão fi­cando um pouco mais sensatos ultimamente. Houve toneladas trovejantes de aplausos para compensar a diminuição no nível de decibéis dos gritos”.
Amigos e familiares foram cumprimentar o grupo nos bastidores, in­cluindo Bessie Braddock, membro do parlamento do Partido Trabalhista do distrito eleitoral de Liverpool; o jovem comediante Jímitry Tarbuck que tinha estudado com John; Elsie e Harry Graves, mãe e padrasto de Ringo; e os pais de George, Harold e Louise, além de sua namorada, a modelo Pattie Boyd, que ele tinha conhecido em 1964 no set de Os reis do iê iê iê. De início, havia planos para mais shows naquela segunda-feira, mas os quatro preferiram tirar uma folga para passar um tempo com os parentes e amigos.
Os Beatles tinham orgulho de ser de Liverpool. Ao contrário de ge­rações anteriores de artistas do norte do Reino Unido, eles não tentavam modificar seu sotaque nem disfarçar suas raízes proletárias. Adoravam o sentimento de comunidade que tinha sido fomentado pela época de dificuldades, a modéstia natural, o senso de humor peculiar e o cosmopolitismo proveniente de gerações de imigrantes. Muito daquilo que transformou os Beatles em algo singular — a espirituosidade, os jogos de palavras, as raízes rústicas e a afinidade com a esquerda - foi uma herança de terem nascido e crescido em Liverpool.
No entanto, a cidade também era um lugar de onde jovens com ambição como eles tentavam escapar. As pessoas eram cordiais e predominantemente da classe trabalhadora, embora a arquitetura do centro da cida­de fosse austera e tivesse certa grandiosidade imperial.
Havia instigantes conexões com importantes portos do mundo por causa dos navios que saiam do Mersey, embora, do ponto de vista cultural, Liverpool fosse atrasada em relação ao sul. Nos anos 1950 e início dos anos 1960, todas as cidades britânicas da região estavam dois ou três anos atrás da capital quando o assunto eram tendências de moda e estilo de vida. Era para Londres que os Beatles olhavam para descobrir as últimas mudanças na música pop, e foi para Londres que se mudaram no primeiro ano em que fizeram sucesso. George disse: “Tenho uma sensação estranha quando volto a Liverpool. Fico triste porque as pessoas lá estão vivendo em um círculo. Elas estão perdendo tanta coisa. Eu gostaria que elas ficassem sabendo de tudo que aprendi fugindo da rotina”.
Os shows de terça-feira em Ardwick, Manchester, foram afetados pe­las más condições da estrada. Uma neblina densa travou o trânsito na Liverpool-East Lancashire Road, e os Beatles só chegaram ao ABC Cinema 20 minutos depois do horário em que tinham que estar no palco. Foi preciso inserir um intervalo extra na programação para compensar, os grupos de abertura estenderam suas apresentações, e o mestre de ce­rimônias Jerry Stevens teve que inventar freneticamente coisas para falar a fim de evitar a revolta do público. De Manchester, eles seguiram para a industrial Sheffield, onde toca­ram no Gaumont Cinema na quarta-feira, 8 de dezembro, e em seguida foram para Birmingham e tocaram no Odeon, no dia 9. Em Sheffield, 20 fãs desmaiaram, e alguém atirou uma jujuba no olho de Paul, o que o incomodou o show inteiro.
O auge da turnê foram as duas datas de apresentação em Londres - a primeira no dia 10 no Odeon Cinema, em Hammersmith, e a segunda no dia 11 no Astoria Cinema, no Finsbury Park. A expectativa era de que aqueles seriam os shows mais difíceis, porque os londrinos tinham mais oportunidades de ver grandes espetáculos e, portanto, se orgulhavam de seu comedimento descolado. Esperava-se que o público do interior fosse à loucura de qualquer maneira, porém os fãs de Londres geralmente faziam com que os grupos tivessem que se esforçar muito para conseguir aplausos. Desta vez, o oposto provou-se verdadeiro. O público nos dois locais entrou em erupção.
Depois do segundo show no Finsbury Park, o jornalista Alan Smith relatou: “Foi o show mais selvagem e rasgado dos Beatles que vi nos últimos dois anos. As garotas corriam pelo palco possuídas por uma fúria alucinante e eram perseguidas por seguranças fortes. Algumas estavam histéricas, e vi uma menina ser carregada para fora do teatro berrando e esperneando com lágrimas escorrendo pelo rosto contorcido. Havia 3 mil pessoas no Finsbury Park Astoria, e juro que todo mundo subiu nos assentos. Agora, depois do show, alguns assentos nas primeiras fileiras jazem em montes de destroços e deixaram de existir. Fiquei saben­do que a histeria e as cenas dos fãs foram ainda piores no Hammersmith Park Astoria, ontem à noite. Eu achava que não diria isso de novo, mas, sem dúvida, A BEATLEMANIA ESTÁ DE VOLTA! Não me entenda mal. Ao afirmar isso, não estou influenciado simplesmente pelos gritos. No NME da se­mana passada, falei sobre como foi extraordinária a recepção dos Beatles em Glasgow, Newcastle, Liverpool e Manchester. Mas esses shows em Londres foram diferentes. Eu não via uma histeria dessas num show dos Beatles desde que a palavra Bealemania explodiu nas manchetes!"
O último dia da turnê britânica foi no Capitol Theatre, em Cardiff, no domingo, 12 de dezembro, um dia depois do show em Finsbury Park. Quase no final do segundo set, ocorreu um incidente preocupante: um homem conseguiu subir no palco quando tocando “Day Tripper” e se jogou sobre Paul e George antes de ser agarrado pelos seguranças. Ele rapidamente foi expulso de lá, mas foi um lembrete claro de como os Beatles estavam vulneráveis a ataques.
E é isso. Depois daquele dezembro de 1965, os quatro Beatles nunca mais voltaram à Liverpool juntos. Assim como todos os shows da turnê, o repertório que tocaram no Empire Theatre foi o mesmo com 11 músicas: I Feel Fine, She’s A Woman, If I Needed Someone, Act Naturally, Nowhere Man, Baby’s In Black, Help!, We Can Work It Out, Yesterday, Day Tripper e I’m Down.

Enquanto eu preparava esta superpostagem, o que mais me surpreendeu e impressionou, foi a falta de vídeos, filmagens, fotos e mesmo informações dessa pequena e última turnê que os Beatles fizeram pelo Reino Unido. Há vários pequenos registro, quase todos, só áudio (ruim) e sem resolução. Por isso, para não encerrar sem nenhum, a gente fica com o show dos Beatles no Empire Pool, em Wembley em abril de 1965, na entrega da premiação do NME. Os Beatles tocaram cinco músicas: "I Feel Fine", "She's Woman", "Baby' In Black", "Ticket To Ride" e "Long Tall Sally". Por enquanto é só pessoal! Espero que tenham gostado e até a próxima. Valeu.

3 comentários:

Rosa Magali disse...

Edu, Edu, Edu... Sempre nos surpreendendo e nos brindando com uma postagem como essa. Adorei!

Edu disse...

Oooiii! Vc é a Magali que trabalhou comigo, a Mônica, o Mariozinho e o Ludovico nos anos 80? Se não for, obrigadão assim mesmo!

Maurororiz.roriz disse...

Edu, conhecemos em Goiânia. Somos amigos. Amei sua Postagem. Fui pesquisar a Empresa Beatles/Pickfair. Estou lendo Magical Mystery Tours Minha Vida com os Beatles, Tony Bramwell com Rosemary Kingsland.