Matéria publicada originalmente em 11 de dezembro de 2009
Por René Ferri“Jamais tive qualquer instrução musical. Ninguém me disse como cantar, ou o que fazer num certo ponto da canção, nem como apresentar canções. Nem Brian Epstein, pois Brian também não sabia – ele era tão amador quanto todos nós!”
Esta declaração de Cilla Black, figura central da cena musical de Liverpool, muito semelhante ao que disse Marianne Faithfull a respeito da cena pop/ rythim & blues de Londres, envolvendo os Rolling Stones e Andrew Oldham, pode dar uma visão distorcida sobre a grande revolução musical dos anos 60 como se tudo tivesse acontecido por mero acaso. Claro que tudo não aconteceu dessa forma tão prosaica, mas a declaração de Cilla Black sumariza esplendidamente a situação de amadores, que agindo por intuição e entusiasmo e, com grande paixão, acabaram se dando muito bem. Manfred Mann, que por anos liderou um grupo que seu nome, desmente que o “Mersey Sound” tenha existido, dizendo que a diferença do som de Liverpool, era apenas o sotaque dos cantores, e o resto foi feito pela imprensa. Mann nunca engoliu ter sido “vendido” nos EUA como parte do “Mersey Sound”, pois em 64 quando o o mundo inteiro começava a se deslumbrar com a música dos Beatles, na Inglaterra, o “Mersey Sound” já estava completamente fora de moda, sendo substituído por uma nova tendência, o “Swinging London”, mais sedutora, mais moderna e urbana. E também mais fácil de vender, por ser mais comercial. Porém, toda a cena musical inglesa dos anos 60, tanto o “Mersey Sound” quanto o “Swinging London”, que incorporava o “British Rythim & Blues” dos Rolling Stones, Pretty Things, Yardbirds e Manfred Mann, tinha a mesma origem, decalcada da música negra estados-unidenses (norte-americana), o jazz, o folk e o blues.
Liverpool era uma cidade operária e grande, a terceira maior de toda a Inglaterrra, com uma mistura étnica, das pessoas das mais diferentes origens, irlandeses, galeses, indianos, africanos, chineses, convivendo juntas, que a tornava um pouco diferente das outras cidades inglesas, também por este aspecto. Também tinha uma cena musical própria e forte, baseada no jazz tradicional, cultivado na Inglaterra desde o final dos anos 40 por orquestras como as de Ken Colyer, Chris Barber e Humphrey, Lyttelton. As bandas de jazz tradicional inglesas foram se interessar no começo dos anos 50, por uma forma de Jazz, conhecida como “skiffle”, que se originou na América nos anos 20. O “skiffle” era um conceito de se fazer música (jazz) de forma amadora, com amigos se reunindo e tocando seus instrumentos em festas, muitas vezes, instrumentos musicais improvisados, como a clássica “washboard”, a tábua de lavar roupa, usada como percursão. O “skiffle” era estritamente instrumental até que Chris Barber formou seu grupo de “skiffle” e gravou um LP em meados dos anos 50. Uma das músicas deste álbum, “Rock Island Line”, tinha como convidado o guitarrista Lonnie Donegan, o qual mostrou sua abordagem diferente do gênero, acrescentando vocais e uma forte dose de country music com influência folk, mais os sons primitivos do blues rural.
Em ’56, o “skiffle” vocal de Lonnie Donegan tinha virado uma mania na Inglaterra, tendo até um programa exclusivo na rádio BBC. “The Six Five Special”. A febre do “skiffle” precedeu outra tendência revolucionária, o rock’n’roll que chegava com os primeiros filmes e os primeiros discos de Bill Halley, Freddie Bell & Bell Boys e Elvis.
A Inglaterra tinha sua própria cultura pop, mas a música produzida, e os interpretes, eram cópias do pop estados-unidenses (norte-americano) e com o rock’n’roll não foi diferente – logo apareceram os ídolos do rock Made In England, que nada tinham de original. Rigorosamente, até o aparecimento da música beat, o “Mersey Sound” de Liverpool, somente The Shadows, com seu som instrumental épico, baseado em guitarras e Joe Brown & The Bruvvers, com seu enfoque muito pessoal do rock´n´roll, misturando rock ao country & western e music – hall tradicional, foram os únicos britânicos a fazer sucesso, com um som marcadamente original.
Em Liverpool, o desenvolvimento do rock’n’roll tomou um rumo muito diferente de Londres – a cidade não tinha estúdios, nem gravadoras, nem editoras musicais, mas tinha uma quantidade anormal de clubes onde se cultivava música ao vivo e muitos bares e locais onde as pessoas freqüentavam para dançar, ao som dos discos, que chegavam vindos dos EUA, com mais rapidez e facilidade, devido ao porto da Marinha Mercante no rio Mersey (o qual logicamente, originou os termos “Mersey Sound” e “Mersey Beat) que corta a cidade, e não apenas os sucessos de Hit Parade, mas também os discos de rythim’n’blues e country & western.
Bob Wooler, o primeiro DJ profissional de Liverpool, fala sobre a excitação que ele provocava entre os mais jovens quando começava a tocar os últimos discos que tinha recebido; e o assédio que recebia dos músicos locais, que pediam que ele indicasse músicas “novas” para agregarem ao repertório. O som de Liverpool, nos seus anos formativos, refletiam o gosto musical dos seus DJs.
A falta de estações de rádio e TV locais, ajudavam a uniformizar o gosto médio da população, em torno da própria música feita ou tocada na cidade, uma vez que isolada, ficava imune aos modismos e tendências que vinham de Londres. É um engano pensar que os Beatles originaram qualquer coisa em Liverpool, em termos de tendência musical; ao contrário eles eram um produto do meio, vieram no bojo de um movimento musical espontâneo, que começou a se desenvolver quando Lonnie Donegan apresentou o “skiffle” e quando a Inglaterra forjou seu primeiro “Elvis”; o cantor “cockney” Tommy Steele, em ’58.




Em Liverpool, o desenvolvimento do rock’n’roll tomou um rumo muito diferente de Londres – a cidade não tinha estúdios, nem gravadoras, nem editoras musicais, mas tinha uma quantidade anormal de clubes onde se cultivava música ao vivo e muitos bares e locais onde as pessoas freqüentavam para dançar, ao som dos discos, que chegavam vindos dos EUA, com mais rapidez e facilidade, devido ao porto da Marinha Mercante no rio Mersey (o qual logicamente, originou os termos “Mersey Sound” e “Mersey Beat) que corta a cidade, e não apenas os sucessos de Hit Parade, mas também os discos de rythim’n’blues e country & western.













Mas em maio de ’62 (sessenta e dois), Epstein mostrou os tapes para George Martin, que entre outras coisas era um homem de A & R (Artists & Repertoire) da Parlophone, uma subsidiária da EMI, que se interessou. Os Beatles voltaram da sua terceira viagem de Hamburgo para uma audição com Martin na Parlophone. Martin gostou muito dos Beatles, mas não aprovou o baterista, Peter Best, que foi mandado de volta a Liverpool. Ringo, o baterista de Rory Storm foi convidado a se juntar ao grupo definitvamente, pois em diversas ocasiões anteriores, ele já havia tocado com os Beatles. Uma sessão foi marcada nos estúdios da EMI na afamada Abbey Road, e em outubro, Love Me Do foi editado.
O som do single Love Me Do / P.S. I Love You era totalmente novo e diferente de tudo que se conhecia em rock, graças à produção de George Martin, um homem que possuía uma orquestra, com gosto mais voltado para música instrumental, para o clássico ligeiro e que antes dos Beatles, jamais tinha produzido um disco de rock.
Os dois lados do disco eram composições de Lennon e McCartney, um risco consciente que correram, pois teria sido mais seguro terem gravado pelo menos no Lado A, uma música de algum compositor “profissional”. Love Me Do tem uma ligeira influencia “country” (por mais estranho que pareça, o country & western era um gênero muito apreciado e cultivado em Liverpool), com as longas frases de gaita-de-boca de Lennon, um hit de Bruce Channel, do começo de ’62, Hey Baby. Já P.S I Love You tem um leve toque latino na percursão, um recurso que os Beatles iriam usar várias vezes. A questão é que os Beatles tivessem caído nas mãos de um produtor convencional, seu primeiro disco teria saído muito diferente, com outras músicas, possivelmente, e com as cordas que sempre adocicaram os discos de rockers ingleses como Marty Wilde, Cliff Richard e Billy Fury.
Em 11 de outubro de ’62, Love Me Do entrava no Hit Parade e em semanas atingiria sua posição mais alta 17º lugar.
Com a campanha e um disco colocado no Top 20, os Beatles saltavam bem à frente dos rivais em Liverpool, Brian Epstein, cuja família possuía uma rede de lojas de discos, onde pela sua primeira vez sua atenção chamada para os Beatles, quando um cliente lhe perguntou sobre uma gravação My Bonnie, feita pelos Beatles na Alemanha, conforme o próprio Brian relata na sua autobiografia A Cellar Full Of Noise de ’64, anotando até a data da ocasião, 28 de outubro de 61 ), criou a Nems Enterprises, para empresariar os talentos promissores de Liverpool. Em janeiro de ’63 (sessenta e três) saía o segundo single dos Beatles, Please, Please Me / Ask Me Why, que foi para o 1º lugar: Porém, quando semanas depois, o primeiro disco de Gerry & The Peacemakers, outro contratado da Nems, How Do You Do It / Away From You em selo HMV, foi também para o 1º lugar, ficou claro que o “Mersey Sound” estava estourando.
O ano de 1963 foi o ano do “Mersey Sound” na Inglaterra, com nada menos que 10 singles colocados em 1º lugar durante todo o ano e mais dúzias de discos colocados em altas posições no Hit Parade. Esta foi a época em que aflorou o extraordinário talento de Paul e John como compositores, que garantiu que os Beatles ficassem muito acima dos concorrentes em termos de sucesso. Depois dos Beatles, de John e Paul, a figura do compositor ficaria para sempre vinculada ao interprete. Antes dos Beatles, raramente o interprete escrevia suas próprias músicas.
Enquanto os Beatles iam quebrando recordes, como enfileirar 12 singles em 1º lugar, colocar um EP Twist & Shout na parada de singles, devido à quantidade que vendeu, e She Loves You, seu quarto single, ter vendido 500 mil cópias antes de ser editado, a maior venda antecipada da década, na Inglaterra, as bandas de Liverpool iam consolidando o “Mersey Sound” com discos de grande sucesso e excelente aceitação critica: Gerry & The Peacemakers, colocou seus três primeiros discos, todos editados em ’63, em 1º lugar: Billy J. Kramer teve dois singles em primeiro lugar e o terceiro apenas em 4º lugar durante o mesmo ano, com composições de John e Paul, “Do You Want To Know A Secret?”, “Bad To Me” e “I’ll Keep You Satisfied”, os Searchers, que não tem eram ligados a Epstein, tiveram um 1º lugar em junho de ’63, com Sweets For My Sweet e um 2º lugar em outubro com Sugar & Spice. Os Swinging Blue Jeans, tiveram um 2º lugar em dezembro de 63, com uma espetacular regravação de”Hippy Hippy Shake”, de um obscuro rocker estados unidense chamado Chan Romero – neste mesmo mês, fechando o ano, os Beatles tinham nada menos que sete singles colocados nos Top 20. Com todos os jornais escrevendo grandes matérias sobre Liverpool, a BBC produziu um detalhado documentário para a TV, chamado “The Sound of City”. A ironia é que quando o programa foi ao ar, os músicos que tinham inventado o “Mersey Sound”, os responsáveis pela lenda da “Beat City”, já tinham se bandeado para Londres buscando uma oportunidade. Alguns tiveram seu momento de glória, mas a grande maioria acabou voltando para Liverpool, que drenada dos seus melhores músicos e talentos, assistiu o “Mersey Sound” definhar e morrer, marcando o fim de uma extraordinária era na história da música pop.



Com a campanha e um disco colocado no Top 20, os Beatles saltavam bem à frente dos rivais em Liverpool, Brian Epstein, cuja família possuía uma rede de lojas de discos, onde pela sua primeira vez sua atenção chamada para os Beatles, quando um cliente lhe perguntou sobre uma gravação My Bonnie, feita pelos Beatles na Alemanha, conforme o próprio Brian relata na sua autobiografia A Cellar Full Of Noise de ’64, anotando até a data da ocasião, 28 de outubro de 61 ), criou a Nems Enterprises, para empresariar os talentos promissores de Liverpool. Em janeiro de ’63 (sessenta e três) saía o segundo single dos Beatles, Please, Please Me / Ask Me Why, que foi para o 1º lugar: Porém, quando semanas depois, o primeiro disco de Gerry & The Peacemakers, outro contratado da Nems, How Do You Do It / Away From You em selo HMV, foi também para o 1º lugar, ficou claro que o “Mersey Sound” estava estourando.
O ano de 1963 foi o ano do “Mersey Sound” na Inglaterra, com nada menos que 10 singles colocados em 1º lugar durante todo o ano e mais dúzias de discos colocados em altas posições no Hit Parade. Esta foi a época em que aflorou o extraordinário talento de Paul e John como compositores, que garantiu que os Beatles ficassem muito acima dos concorrentes em termos de sucesso. Depois dos Beatles, de John e Paul, a figura do compositor ficaria para sempre vinculada ao interprete. Antes dos Beatles, raramente o interprete escrevia suas próprias músicas.
Enquanto os Beatles iam quebrando recordes, como enfileirar 12 singles em 1º lugar, colocar um EP Twist & Shout na parada de singles, devido à quantidade que vendeu, e She Loves You, seu quarto single, ter vendido 500 mil cópias antes de ser editado, a maior venda antecipada da década, na Inglaterra, as bandas de Liverpool iam consolidando o “Mersey Sound” com discos de grande sucesso e excelente aceitação critica: Gerry & The Peacemakers, colocou seus três primeiros discos, todos editados em ’63, em 1º lugar: Billy J. Kramer teve dois singles em primeiro lugar e o terceiro apenas em 4º lugar durante o mesmo ano, com composições de John e Paul, “Do You Want To Know A Secret?”, “Bad To Me” e “I’ll Keep You Satisfied”, os Searchers, que não tem eram ligados a Epstein, tiveram um 1º lugar em junho de ’63, com Sweets For My Sweet e um 2º lugar em outubro com Sugar & Spice. Os Swinging Blue Jeans, tiveram um 2º lugar em dezembro de 63, com uma espetacular regravação de”Hippy Hippy Shake”, de um obscuro rocker estados unidense chamado Chan Romero – neste mesmo mês, fechando o ano, os Beatles tinham nada menos que sete singles colocados nos Top 20. Com todos os jornais escrevendo grandes matérias sobre Liverpool, a BBC produziu um detalhado documentário para a TV, chamado “The Sound of City”. A ironia é que quando o programa foi ao ar, os músicos que tinham inventado o “Mersey Sound”, os responsáveis pela lenda da “Beat City”, já tinham se bandeado para Londres buscando uma oportunidade. Alguns tiveram seu momento de glória, mas a grande maioria acabou voltando para Liverpool, que drenada dos seus melhores músicos e talentos, assistiu o “Mersey Sound” definhar e morrer, marcando o fim de uma extraordinária era na história da música pop.
4 comentários:
Muito bom o artigo. Li num fôlego só !
Ótimo post !!!
Também tenho essa revista no inicio do post !!! Bem Legal !!!
Excelente post! Adorei.
Parabéns ! Agora, essa ´´rock island line´´ seria a mesma do disco 2012 do Ringão ?
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