No dia 5 de dezembro de 1967, John Lennon, George Harrison e suas respectivas esposas foram os anfritiões da festa oferecida para comemorar a inauguração da Apple Boutique, em Baker Street, nº 94, em Londres. Dois dias depois, no dia 7, a Apple Boutique abriria suas portas ao público. John Lennon disse: “Clive Epstein, ou algum outro empresário maluco, nos procurou e disse que tínhamos de gastar parte do dinheiro que ganháramos, pois, caso contrário, ele seria comido pelos impostos. Estávamos pensando em abrir uma rede de lojas de roupas, ou qualquer outra coisa idiota, e então resolvemos que, se fôssemos montar uma loja, teríamos de vender algo de que gostássemos, e tivemos várias ideias. Então Paul teve uma interessante - nossas lojas seriam pintadas de branco, e venderíamos porcelana branca, e coisas do gênero, tudo branco -, é difícil encontrar produtos brancos, mas eles são muito bonitos. Entretanto a história não acabou aí, e montamos a Apple com toda a sua tralha - o mural na parede feito pelo grupo de artistas The Fool, roupas malucas, coisas hippie, e tudo o mais”.
A princípio, a loja apresentava o conceito de que tudo que estava dentro do local, não só as roupas, mas a mobília e os objetos de decoração, seriam vendidos. E nas próprias palavras de Paul, “a loja era um lindo lugar para que lindas pessoas pudessem comprar coisas lindas!”
O grupo artístico holandês, The Fool, foi chamado para criar as roupas e o design interior e exterior da loja, que ficaria no térreo da esquina da Baker Street. Os artistas já haviam pintado o piano de John Lennon, as paredes na casa de George e haviam vestido os Beatles e suas esposas para o especial de TV “Our World”, no qual os Beatles apresentaram pela primeira vez "All You Need Is Love".
Simon Posthuma, do The Fool, descreveu na época o que seria a loja: “Ela terá uma imagem ligada à natureza, como um paraíso com plantas e animais pintados nas paredes. O piso imitará grama, e a escada será como uma tenda árabe. Nas vitrines, haverá sete figuras, representando as sete raças do mundo – negra, branca, amarela, etc. Haverá iluminação exótica e faremos que o lugar seja mais feira livre do que boutique”..
As roupas vendidas na loja tinham inspirações psicodélicas e orientais. Eram muito coloridas, com formas inusitadas parecendo fantasias. Traduzindo bem aquela época em Londres e no próprio rock ‘n roll. Apesar da loja ter muitos visitantes raramente vendia-se algo, pois ela era vista mais como uma atração turística.
Inclusive, sobre atração turística, o próprio prédio era um caso a parte. Sem a autorização da prefeitura de Londres, ele foi inteiramente pintado como um mural psicodélico. Foram chamados estudantes de belas artes para pintar o mural com o projeto do The Fool. A arte durou três semanas, sob forte polêmica, pois até alguns lojistas vizinhos reclamaram das cores berrantes, isto até que a prefeitura avisou que mandaria funcionários para repintar o prédio e multar a Apple. Mesmo assim, os Beatles e o The Fool conseguiram inaugurar a butique com o mural colorido.
Em 1968 a Apple Boutique foi fechada. Para manter o espírito hippie, os Beatles resolveram dar todo o estoque da loja no último dia de funcionamento. Em novembro de 2014, Nova Iorque recebeu um leilão da empresa Augusta Auctions, que colocou à venda várias roupas psicodélicas da Apple Boutique. Uma peça como um simples vestido de seda foi avaliada em US$ 5 mil. Fonte: universoretro.com.br
Para encerrar com chave de ouro esse estranho capítulo na história dos Beatles, a gente confere um trechinho do livrão de Peter Ames Carlim "Paul McCartney - Uma Vida", de 2011. "A empresa começou no final de 1967, como estratégia fiscal. Os Beatles estavam ganhando tanto dinheiro com a venda dos discos e com outras receitas que precisavam investir em alguma coisa, a fim de não perder enormes quantias de numerário para os altõs impostos cobrados às pessoas físicas, na Grã-Bretanha. Era melhor gastar o próprio dinheiro como bem entendessem, em especial se aquilo lhes permitisse não apenas ter um maior controle sobre o seu trabalho, mas também oferecer a outros artistas, menos afortunados, o poder de conduzir as próprias atividades. Assim nasceu a Apple Records. Só que ela não seria apenas uma gravadora. ‘‘Paul queria que ela fizesse de tudo", disse Peter Asher. “Filmes, teatro, televisão, discos e até mesmo naves espaciais." Só que eles fariam as coisas do seu jeito, com ênfase na inspiração e na arte, e não no dinheiro. Afinal de contas, foi assim que eles fizeram sucesso na música. Ficou claro que a abordagem estaria presente em todo o resto também. “A ideia é ter uma companhia ‘subterrânea' acima do chão", Paul disse a Miles, numa entrevista, em 1967. Eles dividiriam os lucros de forma equânime com todas as pessoas da empresa, ele continuou, “para que todos aqueles que necessitem de um Rolls-Royce possam comprá-lo e, então, depois disso, vamos dar dinheiro para todos que precisem de ajuda". Eles deram o primeiro passo em dezembro, abrindo a Butique Apple, onde vendiam uma infinidade de roupas customizadas pelos designers do The Fool, um grupo nebuloso de hippies holandeses estetas que, de alguma forma, tinha conseguido entrar no círculo dos Beatles. O modelo de negócios da loja simplesmente não existia. O Fool era composto de perdulários que torraram o dinheiro dos Beatles, insistindo, por exemplo, em fazer as etiquetas das roupas com seda pura, cujo custo era igual ou superior ao dos outros materiais. Eles também criaram um esmerado mural psicodélico na parte externa da loja que, embora fosse lindo, destoava completamente dos padrões aceitos pela vizinhança, de modo que tiveram de desfazê-lo rapidamente, para repintar tudo de branco e não enfrentar um processo judicial. Por outro lado, os quatro não colaboravam muito, pois faziam visitas separadas que acabavam resultando em ordens e determinações totalmente diferentes umas das outras. Os compradores lotaram a loja, logo que ela abriu, o que pareceu um enorme sucesso. A não ser pelo fato de que muitos deles saíam sem pagar pelas coisas que estavam levando. Ninguém queria agir de forma dura — não era legal —, de modo que a roubalheira seguiu em frente. “Era um paraíso para os ladrões”, afirmou Alistair Taylor, assistente que trabalhou durante muitos anos para os Beatles. A Butique Apple durou sete meses e perdeu algo em torno de vinte mil libras. Lojas, Paul explicou, “não eram o nosso negócio”.
Não deixe de conferir também a postagem O DIA QUE A BAKER STREET FICOU MAIS BONITA, publicada há um ano.
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