sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

OS BEATLES X CASSIUS CLAY


Em fevereiro de 1964, os Beatles chegaram aos Estados Unidos pela primeira vez para realizar uma série de shows no país. Permaneceram nos EUA por duas semanas e causaram furor por onde passaram. No dia 09 de fevereiro, se apresentaram ao vivo no programa de auditório apresentado por Ed Sullivan. O "Silvio Santos" dos americanos naquela época. O programa foi assistido por um público de 73 milhões de espectadores, número recorde para a época. No dia 16, foi a segunda apresentação no programa. Os Beatles estavam em Miami. Agora todos queriam ver os Beatles, como se eles tivessem algum fetiche mágico, como se pudessem resolver tudo – o que de certa forma, realmente podiam. A platéia de Sullivan estava repleta de celebridades anciosas para colocar os olhos nos Beatles, entre elas as lendas do boxe Sonny Liston – que disputaria com Cassius Clay o título dos pesos pesados no fim de semana seguinte – e Joe Luis. Devido a essas presenças, Paul sentiu-se compelido a prever que Clay venceria a luta, o que gerou um convite do relações-públicas Harru Conrad para que conhecessem o jovem boxeador durante um treino no Fifth Strret Gym. 
Os Beatles nunca foram fãs de boxe. Eles não demonstraram nenhum interesse enquanto estavam em Liverpool, mesmo quando o pai de Pete Best promovia grandes eventos da luta no ginásio local. Mas naquele momento eles desviaram uma parcela de seu precioso tempo para encenar o encontro com Cassius Clay. Por que, de repente, isso se tornou prioridade? De acordo com George, “foi uma grande jogada de publicidade. Fazia parte da condição de Beatle, na verdade, ser arrastado e jogado em salas cheias de jornalistas tirando fotos e fazendo perguntas”. Não era nenhum segredo que Clay havia transformado o mundo do boxe com sua personalidade exuberante. Incorrigível tagarela “que podia falar à razão de 300 palavras por minuto”, ele posava constantemente para as câmeras, contando vantagens comicamente e cuspindo versinhos bobos. Ninguém tinha visto ainda uma verdadeira demonstração de seu potencial no ringue, mas ele já havia impressionado a amioria dos críticos como artista de primeira linha. Sendo assim, parecia apropriado que os maiores artistas do momento se desviassem para as órbitas uns dos outros.
Ainda assim, basta dizer que o lúgubre ginásio esfumaçado onde ele treinava foi dominado pela invasão de quatro rapazes de cabelo estranho vestindo calças justíssimas e jaquetas brancas de manga curta. “Dê só uma olhada nesses Beatles! Eles parecem meninas”, grunhiu um brutamontes que fumava um charuto ao lado do ringue. Os Beatles por sua vez, não estavam nada bem-dispostos; tinham ficado chateados pela imposição da visita e se sentido incomodados por ter esperado quinze minutos por Clay. “Onde diabo está o Clay”, Ringo perguntou para ninguém em particular, claramente irritado pelo atraso. Em seguida foi a vez de John resmungar contra a atitude da diva. “Vamos cair fora daqui”, ele disse aos outros. Mas dois guarda-estaduais da Flórida bloquearam a porta até que o anfitrião chegasse.
Se os rapazes tinham planos de escapulir, eles evaporaram no instante em que Cassius Clay – o Desbocado de Louisville – entrou pela porta. “E aí, Beatles?” ele rugiu, desarmando-os com seu charme. “Precisamos fazer algum show juntos na estrada! Íamos ficar ricos.” Ele tinha uma personalidade incrível, um espírito cativante, era marcado para a grandeza e ficou inalterado pela celebridade. Os Beatles gostaram dele imediatamente, e não hesitaram em entrar em cena no extravagante “show” que ele encerrava com elegância. Ele “insistia em se divertir enquanto treinava”. Clay os incitou a subir no ringue e gritou: “Caiam, seus vermes!” – e os rapazes cairam de costas. Então John o instruiu a estender o braço por cima deles “com a mão enluvada, em pose de vitória”, e foi obedientemente atendido por Clay. Ninguém precisava de muito treino. Todos eram, Beatles e boxeador, showmen consumados; eles sabiam seus papéis, aproveitaram todas as deixas. Para fechar o encontro com chave de ouro, Clay agarrou Ringo, suspendeu-o sobre a cabeça e o girou como um cata-vento – do jeito que Popeye se livrava dos inimigos.
Os espectadores e puxa-sacos gritavam, virando os punhos para baixo, condenando a pobre vítima; o treinador Drew “Bundini” Brown, implorou comicamente pela vida do baterista; então Clay deu uma passoa à frente e disparou algumas frases de grande profundidade:
Isso não era exatamente Byroniano, mas agradou muito aos autores de “Love, love me do / you know i love you”. Para os Beatles, que estavam rapidamente se tornando ícones culturais, Clay, com seus 22 anos, era como uma lama gêmea: “Ele tem todo aquele espetáculo maluco sob controle”, eles teriam dito a Brian. Espontâneo e elegante, Clay era genial em seus próprios termos, sem todo aquele “papo-furado”. Eles deixaram o ginásio pouco tempo depois “com grande relutância”. “Clay os impressionou”, lembrava o fotógrafo Harry Benson. Mas o que os cativou e tocou não foi o seu carisma; foi o seu poder. Clay era boa-pinta, mas também socava como uma marreta. Os Beatles sabiam que, se as coisas fossem como Brian queria, a beleza e a fofura seriam tudo o que importava. Ainda assim, a imagem que eles cultivavam, embora os incomodasse, continuava a ser útil e, naquele momento, lhes proporcionava um certo privilégio.
Depois da sessão de fotos de Clay com os Beatles, Sonny Liston declarou que não gostava dos rapazes de Liverpool. Se deu mal! Na noite de 25 de fevereiro de 1964 - na Flórida – Cassius Clay arrasou Sonny Liston (que, curiosamente aparece na capa de Sgt. Pepper's) por nocaute depois do 6º round tornando-se campeão mundial dos pesos-pesados.


2 comentários:

João Carlos disse...

Texto corretíssimo. Em princípio os Beatles foram meio de má vontade.

Valdir Junior disse...

Essas fotos deles com o então Cassius Clay, tem um "Q" de os Trapalhões.