Chego no bar, encontro o Alex. Ele me diz:
-Tu ainda é redator?
Eu não era, mas respondi que sim.
- Então passa lá na agência. Estou precisando de um cara para cobrir as férias do Beto.
Na segunda fui para a agência conversar com o Ratão, o dono. E a primeira pergunta que ele me fez foi...
- Você gosta dos Beatles?
Quando conheci o Edu ele era um ano mais velho do que eu (e até hoje ainda é). Mas havia uma distância muito maior que a idade entre nossas experiências profissionais. Aquele seria o meu primeiro emprego como redator e ele já era um diretor de arte experiente, premiado, respeitado e com muita personalidade. Formaríamos uma dupla. Seu temperamento era considerado explosivo, mas aos poucos o trabalho foi nos transformando em amigos. Até que chegou o dia em que fui convidado para conhecer a sua casa, uma honra para poucos. E desde que cruzei aquela porta, minha vida nunca mais foi a mesma. Eu que achava que conhecia alguma coisa de rock and roll, descobri que não sabia nada.
A casa era um verdadeiro templo do rock e os deuses daquele lugar se chamavam The Beatles. Venerados em quadros, fotos, miniaturas e souvenirs, mas acima de tudo, venerados no som que vinha dos infindáveis cassetes e vinis repletos de raridades, muitos deles em duas, três ou quatro cópias lacradas. Havia tudo dos quatro de Liverpool. Naquele dia passei a ver o rock noutra dimensão. Uma mistura de seriedade e diversão, de porradas e de baladas, de altos e baixos, Jekyll and Hyde. E quando falo que no templo havia deuses eu não exagero. Aos poucos fui descobrindo que a história do Edu e dos Beatles se confundia numa só. A devoção dele pela banda era como a de um fiel à sua religião. Sem fanatismo, mas com total respeito. Havia todo um ritual para começar a ouvir os discos, um preparo para quando ele entrasse no seu outro mundo. Ele dizia que aquele era o único amor verdadeiro de sua vida. O amor que sempre lhe foi fiel, nunca o decepcionou, que sempre esteve ao seu lado, que segurou todas as ondas.
Este ano o Edu comemora quarenta e sete anos de vida e trinta e cinco de beatlemania. Sua paixão pelos Beatles começou aos doze anos, no dia em que foi assistir ao filme Help, na Escola Parque de Brasília. Logo na primeira cena veio o impacto daquelas quatro figuras vestidas de preto, chegando sem avisar. O som, a cena, a atitude que tomou conta do ambiente o pegaram de jeito. Foi ali que ele começou a definir o seu caminho. E na volta para casa, no reflexo do vidro do ônibus, ele começou a ajeitar o cabelo como se fosse da banda, a redefinir a força do olhar, a moldar-se para a vida que acabara de escolher. Na escola virou China Lennon. Na quadra onde morava virou referência da banda, o maior fã. E na vida caminhava passo a passo para tornar-se O Beatlemaníaco.
Ser O Beatlemaníaco não é uma decisão fácil, não é para qualquer um. Afinal a maior banda de todos os tempos tem uma legião de fiéis seguidores que defendem com afinco a história e a imagem dos Beatles. Não se pode falar besteira, é preciso ter base, ter conhecimento de tudo o que se refere às músicas, às histórias dos integrantes, à trajetória do grupo, ao pensamento de John, Paul, George e Ringo. Os Beatles influenciavam o Edu em todos os aspectos da sua vida. No comportamento, na visão do mundo, nas questões sociais. No trabalho como diretor de arte, como artista plástico, como escritor.
No princípio de tudo era muito difícil conseguir as coisas da banda. Eram os anos setenta, tempos duros, militares no comando e o bloqueio às idéias libertárias era grande. Para comprar alguns discos era preciso encontrar os caminhos alternativos. Mas nada era impossível para quem podia contar com a pequena ajuda dos amigos. E entre idas e vindas, lados A e lados B girando no prato, o tempo passou, o Edu cresceu e com ele seu amor pelos Beatles. O que também crescia vertiginosamente era a consciência de todo o universo que havia em torno da banda. Desde as velhas histórias e músicas daqueles que os influenciaram, até as novas gerações de todos que por eles foram influenciados. A esta altura o Edu já havia consolidado o respeito de todos como beatlemaníaco e o seu templo era a mais completa fonte de informação sobre as grandes bandas da história do rock.
No meio desse caminho havia uma banda, e depois outra e outra e mais outras. E no meio dessas bandas tinha o Badfinger.
Durante suas andanças pela Rock and Road da vida, Edu encontrou muita gente boa. Muita guitarra bem tocada, muito baixo botando pra quebrar, muito som, muita história, muito veneno. Mas ele achava que faltava alguma coisa. Eis que numa bela tarde de sábado, com o rádio ligado no Beatles Revolution, o programa do Joaquim Jardim, entra o quadro dos convidados especiais. Então, como daquela primeira vez, ele toma uma porrada. Eram os primeiros acordes de No Matter What, do Badfinger. Naquele instante Edu reviveu a sensação de querer descobrir tudo sobre uma banda. Quem eram os integrantes, de onde surgiram, o que mais eles tocam? Perguntas que buscavam respostas, e ninguém melhor que o Edu para encontrar as respostas, os caminhos, os passos das bandas. E assim começava uma nova história de amor. Claro que os Beatles permaneciam soberanos.
A vida é rápida como um rock, por isso tem que ser intensa. Faça o que tem que ser feito, expresse seus pensamentos. Se você não toca, pinte. Se você não pinta, escreva. Se você não escreve encontre uma maneira de contar sua história. Se você faz tudo isso coisas incríveis acontecem.
Na publicidade os Beatles influenciaram o Edu nos títulos, layouts e conceitos de campanha. Muitas referências e reverências surgiam nas peças. Quando avaliava os Beatles como produto, considerava perfeito o marketing que envolvia toda a projeção do grupo. Quando via a banda com os olhos do artista plástico fazia surgir maravilhas como a série PowerPainting, que transportou para a fórmica toda a vida e força do rock e seus ídolos como John, Paul, Elvis, Peter, Tommy, Jimi e Plant dentre outros. Muita intensidade, muito movimento e muita cor.
Na literatura Edu produziu pérolas como o conto “O dia que meu fusca virou Beatle”. Um texto refinado, bem humorado, dinâmico e, claro, cheio de paixão. Um deleite para os fãs dos Beatles e de boas histórias. Também escreveu o excelente “Uma tarde do outro mundo”, que faz uma viagem pelos mistérios de uma alma dividida entre dois mundos, o real que consome seus dias na cidade e o outro, que mergulha nos seus dramas e conflitos pessoais tendo como porta de entrada seus discos, seus ritos e nada mais. Tudo costurado inteligentemente pelas citações extraídas das músicas dos seus ídolos. Não posso deixar de citar o que pode ser classificado como uma trama policial envolvendo os quatro rapazes de Liverpool. Falo do ótimo e bem estruturado “Eu sou o único e verdadeiro Billy Shears”, que conta a fantástica história de um sósia do Paul McCartney e suas aventuras com a banda. Todos os textos são cuidadosamente elaborados e têm em comum a riqueza de informações e referências do maravilhoso mundo do rock and roll.
Mas, dentre todas as criações do Edu, existe uma que tem a minha preferência, talvez por reunir no mesmo trabalho os seus talentos.Tem o humor da narrativa e a habilidade dos traços somados ao conhecimento do mundo Beatles. E o escracho é a marca registrada do fabuloso livro “Os Barbudão”. Quadrinhos da mais alta qualidade que retratam a vida como ela não é, mas poderia ser. Vejo nos Barbudão um verdadeiro deleite dessa relação intensa que o Edu tem com os seus ídolos e somente ele poderia brincar com a tamanha intimidade. Resultado que só é possível por quem tem uma estreita relação de amizade construída em mais de três décadas de convivência diária.
E quando achava que tudo estava completo, eis que surge O baú do Edu. Mais que um blog, o baú é como uma revista diária e cada dia é como uma página repleta de informações, arte, cultura e rock, muito rock mesmo. Um baú generosamente aberto para que todos possam revirar à vontade as histórias de quem fez dos Beatles e do rock a sua própria história. E, como o próprio Edu diz, tudo foi feito com muito amor e respeito ao que os Beatles produziram e em nenhum momento houve a intenção de macular o mito. Porque tudo foi feito com amor, porque tudo o que nós precisamos é de amor. E no final, o amor que você leva é igual ao amor que você deixa.
Feliz aniversário, Edu!
Marco Miranda.
Valeu Marco! Obrigado! Acho que não estou com essa bola toda. A melhor parte de tudo isso são meus amigos. Muito bem. O aniversário é meu, mas quem ganha o presente é você (risos)! Para comemorar, 5 supervídeos com THE BEATLES. Oh, YEAH! Lembrem-se: para parar a rádio e ver os vídeos, ESC. Para voltar, botão direito no ícone e EXECUTAR.
Abração!
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