Hoje é o meu último dia na Índia. Ainda estou em Varanasi, a cidade sagrada dos hindus. Depois de 7 dias nesse país, saio daqui com todos os meus sentidos alterados. Eles nunca mais serão os mesmos, tenho certeza.
O olfato aprendeu a sentir ao mesmo tempo o cheiro dos indianos, do incenso, do sândalo, do estrume das vacas sagradas, dos corpos queimando no Ganges, das essências, das especiarias, presentes em todas as ruas pelas quais caminhei.
A audição, que normalmente prefere o silêncio ao barulho, foi invadida pelas buzinas ensurdecedoras dos tuc-tucs, rikishas e carros desgovernados, pela suavidade repetitiva dos mantras, pelo hindi ininteligível, pelos clamores dos mendigos, pelos vendedores de tranqueira, pela cítara (que George tanto gostava).
O paladar aprendeu um pouco a tolerar comidas apimentadas, se viciou na masala (pra misturar no chá), e nunca bebeu tanta água (mineral).
O tato experimentou a textura da serpente que se enrolou no meu pescoço e a língua dela no meu braço, a tromba peludinha do elefante baby, as encrustrações no mármore do Taj Mahal, as inscrições do alcorão nas paredes de sandstone dos fortes dos marajas, a água do Ganges, a aspereza das mãos dos indianos trabalhadores.
E a minha visão foi afetada pela sujeira e pobreza das ruas da velha Delhi, que me fizeram chorar um dia inteiro. Se assustou com o trânsito maluco de tuc-tucs, rikishas, vacas, pessoas, que fazem suas próprias regras e são verdadeiros loucos nas ruas. Mas também se encantou com as cores dos saris das mulheres nas ruas e no campo, com as paredes da cidade rosa (Jaipur), com a exuberância arrebatadora do Taj Mahal (Agra), com o olhar dos peregrinos de Varanasi.
Mas o principal sentido afetado pela força da Índia, foi o sexto, da intuição. Porque intuição é um misto de conhecimento e sensibilidade.
Percebi o tamanho da minha ignorância sobre tudo que vi por aqui. Aprendi que, segundo o hinduismo, uma vida plena só existe se houver prosperidade e sabedoria juntas, pois isoladas não promovem evolução e fazem do homem um idiota. E que pro budismo, todas as vidas tem problemas e que é possível sim passar por eles com o semblante sereno de quem domina as emoções com a meditação. No Ganges, vi vida e morte sendo celebradas ao mesmo tempo, como faces da mesma moeda, fazendo da dualidade a beleza de tudo que somos: luz e escuridão, dia e noite, pobreza e riqueza, saúde e doença, o forte e o fraco.
Aprendi que respeitar as crenças e as realidades, sem julgar, sem impor a "minha" verdade não é fácil, mas é a única maneira de se alinhar com a força da Índia. Vi tudo acontecendo ao mesmo tempo agora. Coisas que pra nós, ocidentais, parecem absurdas, caricatas, esquisitas. Deixo a Índia respeitando absolutamente tudo que vi, ouvi, senti, provei e toquei. Consciente do meu tamanho... grande pra algumas coisas, e pequeno pra muitas.
E saio daqui com um grande dever de casa: aprender mais, evoluir mais, simplificar mais. A Índia turbinou a minha sensibilidade e me permitiu jogar no Ganges as cinzas de sentimentos que eu não queria mais carregar. Deixou a minha bagagem mais leve ao me permitir escolher o que levar. Me fez refletir sobre tudo o que é mais importante na minha vida: as pessoas que amo, do
passado, do presente e do futuro. E, sobretudo, o peso das minhas decisões em relação a elas, pois lhes sou responsável no limite das minhas ações.
Namastê.
Valeu!! Abraços, Lara Selem
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
WELCOME BACK MISS L!
Caros amigos: nossa querida amiga Lara Selem esteve fazendo uma turnê pelo oriente e nos conta, de forma emocionante e envolvente suas impressões sobre a velha índia. Obrigado, Lara! É um grande prazer ter você aqui de volta. Abração!
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4 comentários:
Hey, Miss L! Deve ter sido realmente um passeio incrível! Nossos parabéns pelo seu talento, simplicidade e humildade. E mais uma vez, obrigado por estar aqui. Beijão! Edu
Obrigada Edu!! De fato, foi incrível.
...Remember: to let it into your heart, than you can start to make it better!
Minha doce amiga, apesar da curiosidade que sempre tive pelo oriente, mesmo com os documentários que já assisti, sem nunca ter estado por lá, tive a real sensação de ter te acompanhado de alguma forma nessa passagem...mais ainda agora com uma transcrição tão bela e simples, como você!! Namastê!!!
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