quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

AS BALSAS QUE "DESCIAM" O RIO BALSAS

Caros amigos: foram incontáveis as vezes que meu pai - Pedro Ivo - apareceu aqui no nosso Baú do Edu. Esta postagem particularmente, tornou-se muito especial para mim. Foi publicada originalmente em 3 de outubro de 2009 (ele ainda estava "bom"), e escreveu esse texto especialmente para eu publicar aqui, no Baú. Foi uma das mais lidas e acessadas desde o início do blog! Gostaria imensamente de prestar mais esta homenagem a ele, que foi o melhor amigo durante toda minha vida. Me alimentava, pagava minhas escolas caríssimas (eu era o único dos 4 filhos que estudava em escola particular!), e me dava uma mesadinha que eu juntava para comprar os discôes! Hoje, pelas minhas contas (sempre erradas!) é que estaria fazendo 1 semana que ele partiu. Mas a conta deles é diferente! Talvez, quem sabe, seja por isso que nunca aprendi a fazer contas. Profissão que ele era mestre! Vamos lá?

Clique que amplia!

AS BALSAS DE BURITI
Pedro Ivo de Sousa e Silva

O meu primo Raimundo Floriano está escrevendo um livro no qual dedica um capítulo às “balsas” do Rio Balsas. Meu cunhado Cesário Barbosa Bonfim já fez um excelente trabalho sobre este assunto, cujo conteúdo aquele já está autorizado a usar. O Raimundo pediu ao meu filho Eduardo Bonfim e Silva que desenhasse uma “balsa” para ilustração de sua obra. O Eduardo, apesar de toda boa vontade, ficou em dificuldade por ter saído da nossa cidade de Balsas ainda muito criança e nunca ter viajado em tal embarcação, bem como por não ter em mãos uma fotografia retratando um “balsa grande”, mas tão somente de pequenos “macacos” - como eram chamadas as ”balsinhas” para viagens curtas - pediu-me então que eu fizesse um esboço do que ainda me lembro de uma ”balsa grande”, com capacidade para transportar muita carga e até passageiros em certas épocas do ano.
Assim, mesmo não sendo desenhista, resolvi tentar atender ao pedido e rabiscar um arremedo (conforme anexo), apenas para dar uma idéia do que ainda me lembro a respeito daquele rústico meio de transporte, de tanta utilidade na época.
A ”balsa” era feita de talos de palmas do buritizeiro jovem, cortadas ao rés do chão, secos e/ou verdes; os verdes ficavam um bom tempo ao sol, para depois serem juntados aos secos, permitindo assim a uniformidade de flutuação de todos, cuja quantidade utilizada dependia do volume de cereais a ser transportado da região dos “gerais” para a cidade de Balsas; eram cobertas de palha de coco babaçu ou de piaçava, tendo duas vogas fazendo papel de leme, sendo uma na frente e a outra atrás. Transportavam arroz com casca, feijão, farinha de mandioca, tapioca e até pequenos animais, tais como leitoas, galinhas e outros. Eram os produtos desses pequenos lavradores arduamente conseguidos em pequenas “roças de toco” e chiqueiros muito rudimentares. Naquela época sequer era conhecido o arado puxado a animal ou qualquer outro acessório que facilitasse a cultura, exceto o machado e a enxada. A modernidade passou diretamente desses utensílios para as máquinas agrícolas, o que fez desaparecer, praticamente, o pequeno lavrador, restando apenas aqueles que plantam para a própria subsistência.
Chegando em Balsas, depois de vendidos os produtos, quase sempre aos proprietários das usinas de beneficiamento de arroz e a pequenos quitandeiros da cidade; os talos de buriti eram adquiridos pelos intermediários desses produtos, que os deixavam por muitos dias arrumados no sentido vertical para desencharcarem, a fim de que pudessem ser reutilizados na confecção de grandes “balsas” que carregavam não só o arroz pilado (como era chamado), mas também couros de boi, peles silvestres, crina animal, penas de emas e porcos vivos para a cidade de Floriano, no Estado do Piauí ou, eventualmente, para Teresina, capital do mesmo Estado.
As “balsas” também levavam a estudantada ao término das férias de fim de ano; nestes casos eram divididas ao meio, no comprimento, com uma parede de palhas, formando um quarto para a acomodação das moças e de uma ou mais senhoras encarregadas da comitiva. Os rapazes armavam suas redes na outra metade, sobre o lastro formado de sacos de arroz pilado que se estendia por todo o assoalho da “balsa”.
O comando ficava a cargo do “mestre” – exímio conhecedor de todos os canais percorrido nos rios Balsas e Parnaíba, mas sempre ao sabor da correnteza das águas, auxiliado pelo “contra-mestre”, o qual também fazia as vezes de cozinheiro.É importante dizer que esses bravos trabalhadores retornavam do destino a pé, levando nas costas não só o saco com a rede de dormir e alguns pertences, mas também as pás das vogas para serem usadas novamente.
Ao chegarem a Floriano eram desmanchadas e vendidas a quem interessasse, para confecção de cercas de buriti nos quintais daquelas pessoas de menos posse.

Brasília, 25/09/2009 – Pedro Ivo de Sousa e Silva

Postado por Edu. Sábado, Outubro 03, 2009

22 comentários:

Edu disse...
Querido Papai: não tenho palavras para agradecer nem expressar minha emoção pelo Senhor estar aqui. Obrigado demais! 4 EVER!
3 de outubro de 2009 08:44

Anônimo disse...
Muito interessante, Edu!
pena que muitas coisas importantes foram perdidas com a chegada da "modernidade". Parabéns pelo texto dele.
Abraço
Henrique Behr (Alêma)
3 de outubro de 2009 09:21

Anônimo disse...
AHHH...AGORA JÁ SEI DE ONDE VEM TANTO TALENTO...ABRAÇÃO! (CLÁUDIA DIAS)
3 de outubro de 2009 10:02

Luiz disse...
Dudu:
que maravilha!
fiquei emocionado com esse
espaço do BAÚ para essa
importante matéria. Balsas
terra do meu querido amigo:
CARIOQUINHA. Meus comprimentos para
RAIMUNDO, EDUARDO e PEDRO IVO
luiz clementino
3 de outubro de 2009 11:02

Anônimo disse...
Caro Eduardo,
Muito legal o texto que o tio Pedro Ivo fez sobre "as balsas".
Gostei muito do seu blog, a gente viaja lendo os posts e ouvindo esses hits inesquescíveis dos Beatles.
Parabéns e um grande abraço.
Marcelo (primo)
3 de outubro de 2009 12:13

Leandro disse...
Edu, arruma um macaco pra gente dar umas voltas no laguim véi.
3 de outubro de 2009 12:25

Anônimo disse...
Perfeitos, texto e desenho. Esta empreitada vai ser um sucesso!
Bjs Rosana.
3 de outubro de 2009 16:21

aracy***** disse...
Que coisa linda ler um texto do meu tio mais amado!
3 de outubro de 2009 18:16

Cak disse...
Que aula nosso pai nos deu hein?! Lindo!! legal demais. Meu Deus, tô morrendo de saudade...
3 de outubro de 2009 18:18

LSelem disse...
Show!!! Parabéns!!!
3 de outubro de 2009 18:34

Edu disse...
Antonio Estevam disse:
Badfinger,
Isso é o que chamo de uma participação especial, padrão de luxo, modelo exportação.
Bacana o texto do P.I.
Pbns pela idéia.
Saudações vascaínas.
4 de outubro de 2009 06:32

Edu disse...
Izaura disse:
Eduardo, fiquei muito emocionada ao ler o texto do Pedro Ivo, com quem acabei de conversar por telefone. Mesmo eu sendo de Balsas, desconhecia tantos detalhes: é impressionante a memória de seu pai. Para ser sincera, nunca tive a oportunidade de entrar numa balsa, só as conhecia por fora, mas me lembro do quanto ficávamos felizes quando avistávamos uma descendo nosso querido Rio Balsas.
Parabéns ao Pedro Ivo, meu irmão muito querido, pelo belo texto que me trouxe tantas lembranças e a você, pela iniciativa de publicá-lo. Torço para que o livro do Raimundo seja um sucesso.
Beijos.
Izaura
4 de outubro de 2009 06:34

Edu disse...
Valeu, galera! Viva o Papaiiiiii!!!!
4 de outubro de 2009 18:30

Anônimo disse...
As histórias de Balsas me lembram as navegações descritas por Gabriel Garcia Marques em Amor no Tempo do Cólera. Sem falar nesta Macondo maranhense que é a família Silva. Parabéns, PI! (Mônica Menescal)
4 de outubro de 2009 21:33

KRÜGER disse...
Pô Edu! Muito legal a história. Melhor ainda saber que teu pai tá aí, firme e forte, conforme dá prá ver na foto. Abração.
5 de outubro de 2009 08:20

Marco disse...
ÀS BALSAS DO BALSAS

O tempo corre como as águas de um rio.
E sobre as águas do rio Balsas
As balsas deslizavam mansamente.
Levando alimento, levando notícias.
Levando sonhos, levando gente.

O rio corre como as águas do tempo
E o que hoje não mais se vê sobre as águas
Flutua num rio de lágrimas tiradas do pensamento.
Lágrimas da saudade cultivada pelo eterno tempo.

Quem me dera ter sido menino para descer o rio sorrindo.
Quem me dera viver a emoção de ver a balsa partindo.
Quem me dera nadar de braçadas nos braços deste rio
E na relva de suas margens, sob o sol aquecer o frio.

Balsas que não vivi, lugar que nunca vi.
Conheço-te apenas dos versos,
Que os teus filhos saudosos entoam,
Das palavras que ao vento voam.

Quanta história corre em suas águas
Quantas mágoas destiladas em gotas
Quantas vidas por ti passaram
Tantas outras em ti ficaram.

Salve as águas do rio Balsas
Salve as balsas das águas do rio.
Salve o tempo que hoje descubro e vivo
Com as histórias do seu Pedro Ivo.
Um grande abraço ao Seu Pedro Ivo e todos da família.

5 de outubro de 2009 10:09

Anônimo disse...
Edu, Parabéns ao PI pelo brilhante texto e ilustração.
É de PRIMEIRA, ESPECIAL DE LUXO,
Abração,
Casusa Neto.
5 de outubro de 2009 14:57

Cazuza Júnior disse...
Edu, Maravilha! Parabens ao Tio P.I. Nasci em Balsas, mas nunca vivi nesta cidade. Estive lá por apenas três vezes. Apesar disso, tive a oportunidade de conhecer tanto os macacos como as balsas, por dentro e por fora. Peguei várias caronas do Curtume ao Porto da Passagem, quando não ia a nado mesmo.
Abraço,
Cazuza Jr.
5 de outubro de 2009 21:07

Anônimo disse...
Tio Pedro Ivo, homem sério, Pai de família dedicado, exemplo a ser seguido... deixamos nossos mais profundos sentimentos para toda a família...
Helder, Rita de Cássia e João Pedro Simões
12 de fevereiro de 2010 13:39

Anônimo disse...
Saudades do tio, lembranças da sua dignidade, sua simplicidade e sua amizade.
Tia Leonor, Adelmar, Eduardo, Marília e Cacilda, estamos juntos nesse momento difícil, mas com a certeza de que ele já está num mundo muito melhor.
Flávio José, Nilvane, João Armando e Ana Flávia
12 de fevereiro de 2010 18:56

Anônimo disse...
QUERIDO PRIMO EDUARDO,QUE COISA LINDA QUE VC FEZ...,TENHO CERTEZA QUE O TIO PEDRO IVO FICOU MUITO SATISFEITO E ORGULHOSO COM VC.... AGORA,SÓ NOS RESTAM AS LEMBRANÇAS FELIZES QUE TIVEMOS A SEU LADO. TÁ DOENDO....PARECE MENTIRA, É INACREDITÁVEL,PESADELO...AINDA NÃO CAIU A FICHA ...DÁ UM DESESPERO ...SÓ DEUS PARA ALIVIAR ESSA DOR TERRÍVEL QUE ESTAMOS SENTINDO....TE ADORO...UM BEIJO CARINHOSO DA SUA PRIMA...RITA DE CÁSSIA.
16 de fevereiro de 2010 16:50

Rob disse...
Linda homenagem que você fez a seu pai.
Ele se foi desta vida mas continua vivo em meu coração
Rob
18 de fevereiro de 2010 16:38
E é isso! Espero que tenham gostado, voltem sempre e deixem seus comentários. Aliás, quem deixar qualquer comentário até o dia 24/02, poderá ganhar 01 álbum duplo do John Lennon " WORKING CLASS HERO" lacrado e importado! Sei que as postagens andam escassas... mas acho que, com o passar dos dias (All Thihgs Must Pass) as coisas voltarão ao ritmo normal, que é o mais puro e melhor Rock and Roll já produzido no planeta. Acho que agora, depois disso tudo, nada melhor do que chamar meu amigo Sir Paul McCartney para fazer uma canjinha para quem está junto com a gente... Senhoras e senhores, especialmente do discão "OFF THE GROUND", Mr. Macca e seu pedido de "C'MON PEOPLE" para todos nós.Thanks 4 ever, everybody!

Um comentário:

Tio Cazuzinha, Ana Paula e Valéria disse...

Caro Eduardo,
Chegamos em Balsas e a ficha ainda não caiu, a sensação q a gente tem é q o Pedro Ivo está viajando ou mesmo como a Leonor sempre fala de um pesadelo terrível. As lembranças dele na nossa memória são constantes.
Mas tenho a certeza q ele esta mto orgulhoso da família dele, vcs são filhos especiais mesmo.
Que Deus nos dê força para suportar essa imensa dor.
O Pedro Ivo era uma pessoa maravilhosa.