segunda-feira, 20 de novembro de 2017

OS TEXTOS DAS CONTRA-CAPAS DOS DISCOS DOS BEATLES*****

Uma das curiosidades bacanas que acompanhavam os primeiros álbuns dos Beatles, era que, a contra-capa trazia um texto explicativo – uma resenha – sobre cada um. Esses textos eram comerciais ao extremo, e de tão ingênuos para a época, chegavam a ser bobos e dispensáveis. Era uma prática comum, de uso quase obrigatório, os LPs (Long Plays) como foram batizados os discos de vinil de 10 polegadas no final dos anos 1940, trazerem um texto que tentasse atrair o consumidor de forma definitiva. Embora, cada vez com menos frequência, essa prática ainda perduraria por anos. Quando os Beatles apareceram, não foi diferente. Assim, os responsáveis pelos textos nas capas dos álbuns dos Fabs, eram feitos pelo assessor de imprensa de confiança, contratado por Brian Epstein. Tony Barrow foi o autor dos três primeiros: Please Please Me, With The Beatles e A Hard Day’s Night. Barrow foi o primeiro assessor de imprensa e publicitário dos Beatles. Foi ele que cunhou o indelével apelido “Fab Four” (quatro fabulosos) e ajudou a configurar a visão que o mundo tinha dos Beatles. E foi assim até a explosão de A Hard Day’s NightBrian achou que os Beatles precisavam de um relações públicas que falasse diretamente ao mercado americano. Para Brian, Derek Taylor era "o cara". Barrow continuou colaborando com a Nems, mas também assessorava dezenas de outros artistas. Assim, coube a Taylor escrever o texto do próximo álbum, Beatles For Sale. A partir deste álbum, o uso desses textos foi se mostrando inútil e essa prática foi temporariamente encerrada. De forma que todos os álbuns seguintes dos Beatles (exceto Yellow Submarine) ficaram livres de carregarem esse fardo. Curiosamente, só no disco, que traz a trilha sonora do filme Yellow Submarine, lançado em 17 de janeiro de 1969, tornou a aparecer outro desses textos que, deveria ter sido escrito por Derek Taylor que acabou dando uma de joão-sem-braço e publicou uma crítica pronta de um tal Tony Palmer, do “London Observer” que, na verdade, era sobre o “Álbum Branco”. É importante nunca esquecer, que, como bem disse o amigo Valdir Junior na postagem sobre Tony Barrow, numa época distante onde ainda nem se imaginava sonhar com a internet e a informação era mínima, esses textos eram ouro! E agora, com a mais absoluta exclusividade de sempre, a gente confere aqui esses cinco textos, na íntegra, tal e qual foram publicados, sem correções ou atualizações de português.
A música “pop" é um movimento contagiante, nos dias de hoje. Os Beatles foram notados musicalmente, em outubro de 1962. Como revisor de discos, meu natural interesse pelo grupo impediu-me de tomar partido em seu primeiro sucesso. Dezoito meses antes da primeira visita deles aos estúdios EMI, em Londres, os Beatles já tinham sido eleitos os favoritos de Merseyside, e era inevitável que seu primeiro disco Parlophone, “LOVE ME DO", entraria diretamente em 1° lugar no “hit parade" local, em Liverpool. As chances do grupo de entrar na parada nacional de sucessos pareciam muito remotas, pois nenhum outro conjunto havia reunido os “best sellers” através de gravação em disco. Mas acontece que os Beatles fizeram história desde o início, e “LOVE ME DO" vendeu muitas cópias em suas primeiras 48 horas, subindo para os primeiros lugares do “hit parade" do país. Em tantos anos de trabalho, nunca vi um grupo britânico tomar a dianteira com tamanha rapidez. Nos seis meses que se seguiram à apresentação de “LOVE ME DO” entre as “20 mais", quase todos os jornais do país, que falavam de música, começaram a fazer elogios aos Beatles. Os leitores do “New Musical Express” elegeram os rapazes, o grupo mais popular, colocando-os, surpreendentemente, nas pa­radas, baseados, apenas, no lançamento de um disco. (1962/1963). As fotografias do grupo foram estampadas nas primeiras páginas de três jornais especializados no assunto. Todo mundo se interessou pelos novos sons vocais e instru­mentais que os Beatles haviam introduzido na música. Brian Matthew (que havia apresentado os Beatles a milhões de expectadores e ouvintes em seus programas, “Thank Your Lucky Stars", “Saturday Club” e “Easy Beat”) descreve o quar­teto como visualmente e musicalmente o mais excitante e com­pleto grupo que apareceu desde THE SHADOWS. Revendo-se ou se produzindo disco, não se pode fazer pre­visões a longo prazo quanto ao seu sucesso. O hit parade nem sempre consegue manter as execuções mais notáveis do dia e por isso não se deve presumir que a versatilidade conta para tudo. Durante a gravação de um programa na Rádio Luxemburgo, na série EMI FRIDAY SPECTACULAR, convenci-me de que os Beatles estavam preparados para desfrutar da fama que os colocaria, merecidamente, em primeiro lugar. O auditório de jovens não conhecia a relação dos artistas e dos conjuntos que iam apresentar-se, e, quando Muriel Young começou a chamar os Beatles pelos seus primeiros nomes, John... Paul... o resto de sua apresentação foi sufocado por frenéticos aplausos. Não tenho a mínima idéia de que qualquer outro conjunto — Britânico ou Americano — pudesse ser tão prontamente identificado e bem acolhido só pelo anunciar de dois nomes. Para mim, esta foi a prova fundamental de que os Beatles (e não apenas 1 ou 2 de seus discos de parada de sucesso) haviam chegado ao ponto máximo de popularidade, reservado aos poucos privilegiados do reino do disco. Logo depois, os Beatles provaram sua força pop, quando saltaram de uma colocação mais baixa do “hit parade” para os "10 mais” do país, com seu segundo compacto simples “PLEASE PLEASE ME”. Este disco de vendagem rápida continuou a surpreender todos os competidores quando saltou para o ambicioso primeiro lugar no final de fevereiro. Mais de 4 meses depois do lançamento de seu primeiro disco, os Beatles tornaram-se os maiores recordistas de vendagens. O produtor George Martin nunca teve dificuldade na esco­lha das canções para os Beatles. John Lennon e Paul McCartney têm suas próprias composições populares, já prontas, para aten­der ao mercado de discos até 1975. Entre eles, os Beatles adotam o slogam “faça você mes­mo”. Eles fazem suas próprias letras e seus próprios arranjos vocais. A música dos Beatles é impetuosa, pungente, desini­bida, quente e exclusiva. O slogan “faça você mesmo’ assegura completa originalidade da música. Embora tantas pessoas achem que os Beatles têm um estilo transatlântico, sua única influência real foi a singular mar­ca do Rhythm and Blues, música popular que sobressai no Merseyside e que os próprios Beatles têm ajudado a promover desde sua formação, em 1960. Este LP compreende 8 composições de Lennon-McCartney associadas a 6 (seis) outras que se tornaram as favoritas do variado respertório dos Beatles. A admiração do grupo pelo trabalho de The Shirelles é demonstrada pela inclusão de BABY IT'S YOU (John faz o solista vocal com George, e Paul faz a harmonia), e BOYS (que permite ao baterista Ringo fazer sua primeira apresentação como vocalista). ANNA, ASK ME WHY e TWIST AND SHOUT que também destaca John como solista, enquanto DO YOU WANT TO KNOW A SECRET joga o spotlight em George, como na apresentação ao vivo. MISERY pode soar como um dueto próprio criado pela multigravação de uma única voz... mas o efeito é produzido pelas vozes de John e Paul. Há somente um “trick duet” que está em A TASTE OF HONEY, destacando uma voz dupla de Paul. John e Paul ficam juntos em THERE'S A PLACE e I SAW HER STANDING THERE, e George junta-se a eles em CHAINS. LOVE ME DO e PLEASE PLEASE ME. TONY BARROW
Neste fabuloso LP podem ser ouvidos quatorze lançamentos recentemente gravados, incluindo muitos shows favoritos. Os Beatles repetiram a mesma fórmula que tomou seu primeiro LP “Please Please Me" (Por favor, agrade-me) o LP mais rapidamente vendido em 1963. Selecionaram nova­mente oito de suas composições originais, paralelamente a outras seleções do repertório de gravação da R. & B. Americana, dos artistas que mais admiram. A metade da primeira parte tem o firme comando de John, na execussâo vibrante de “It Won't Be Long Now", seguem mais duas composições de Lennon/McCartney, a dupla notável de artesãos do som, cantando seus próprios temas em ALL l’VE GOT TO DO e ALL MY LOVING (Tudo que me resta fazer e Todo meu amor). No primeiro número, mais lento, John lidera a parte vocal enquanto Paul cuida da harmonia. Em ALL MY LOVING, Paul vocaliza sob a luz dos refletores, e John e George fazem a parte do Coro. É algo soberbo ouvir o solo típico de guitarra tocado por George, especialmente em ALL MY LOVING. DONT BOTHER ME (Não me perturbe) marca o debut de George Harrison no mundo do disco como compositor. É uma peça de ritmo acelerado, com um tema musical ca­tivante. Apoiando a voz marcante de George, o restante do quarteto cria alguns efeitos instrumentais fora do comum. Paul consegue tirar um som surdo e oco de seu instrumento, John toca o tamborim e Ringo um bongô árabe (não pergun­tem onde o conseguiu), dando cada um o máximo de si ao conjunto. Em um número apreciável de gravações anteriores dos Beatles, o Produtor George Martin fez parte do grupo, e combinou então os sons do piano aos arranjos instru­mentais. Em LITTLE CHILD (Criancinha) porém, é Paul McCartney quem toca ao piano. A parte vocal deste rock é formada por John e Paul, enquanto Paul acompanha pequenos trechos ao piano e John usa outro microfone para acrescentar pequenas frases musicais intercaladas, com um órgão de boca. Quem considera a interpretação de Paul em A TASTE OF HONEY (Um gosto de mel) uma das melhores do primeiro LP, ficará felicíssimo ao ouví-lo novamente interpretando uma balada romântica em TILL THERE WAS YOU (Enquanto havia você), o sucesso do show “The Music Man". Nesta faixa Ringo faz o fundo musical com o bongo para o solo de Paul, enquanto George e John tocam as guitarras acústicas. Paul é o único a usar instrumento elétrico, fa­zendo pulsar melodiosamente o baixo. Se você já leu multo comentário musical da imprensa sobre o “Merseyside”, conjunto rítmico da boate “The Cavern”, pensou que provavelmente o grupo de Liverpool deveria ocupar o programa Inteiro. A direção cativante dada por Paul a TILL THERE WAS YOU era um sucesso no local antes mesmo da época de “LOVE ME DO" (Ama-me), quando os Beatles foram campeões de bilheteria nesta boite atual­mente famosa. A primeira parte termina com um número que já foi anteriormente sucesso do grupo “The Marvelettes", chama­do “PLEASE, MR. POSTMAN" (Por favor, Sr. carteiro), so­bressaindo a dupla faixa de John Lennon, acompanhado pelas vozes de George e Paul. O ROLL OVER BEETHOVEN (Variações sobre Beethoven) de Chuck Berry tem sido um dos números mais citados em performances dos Beatles. George faz dueto consigo mesmo, e os outros rapazes contribuem para a atmosfera de euforia contagiante batendo palmas ritmadamente. Segue-se a faixa alegre de Paul HOLD ME TIGHT (Abraça-me fortemente), segunda da face B, com ritmo de palmas mais o acompanhamento vocal enérgico de John e George. Os Beatles têm grande admiração pelo grupo rítmico ameri­cano “The Miracles", e na interpretação de YOU REALLY GOT HOLD ON ME (Você realmente me conquistou) John e George atacam agressivamente a parte vocal, e Paul junta-se a eles nos trechos do Coro. Incidentalmente, é George Martin o pianista nesta faixa, com a qual os Beatles prestam uma homenagem ao The Miracles. Observando o entusiasmo tremendo despertado por Ringo sempre que interpreta BOYS (Rapazes), John e Paul jun­taram seu talento com o fim de produzir um número espe­cial para a voz quente do baterista. Resultou daí o deli­rante I WANNA BE YOUR MAN (Quero ser seu). John Lennon toca o órgão Hammond, fazendo o acompanhamento. Ainda que sejam menos conhecidos na Europa que outros grupos tais como The Crystals ou The Shirelles, o grupo feminino “The Donays” sempre foi respeitado pelos Beatles, profissionalmente falando. Por conseguinte, participam deste número de ritmo compassado, oferecendo-o a George Harrison. John e Paul fazem a parte da harmonia, e Ringo acompanha com suas maracas. A composição final é de Lennon/McCartney, na qual se destaca a dupla faixa com John Lennon cantando NOT A SECOND TIME (Não outra vez). O Trabalho de George Martin ao piano sobressai neste e no número final do LP, MONEY (Dinheiro). Paul descreve MONEY como “A really big screamer” (um estouro), e recorda as várias ocasiões em que esta apre­sentação provocou a mesma euforia que Twist and Shout. MONEY foi bastante gravado no mercado americano do blue. John canta agressivamente a letra, com sentimento e força expressiva, enquanto George e Paul dão as respostas ao tema. MONEY é o clímax perfeito para este LP fora de série. Espero que não o deixe sem fôlego, e que consiga voltar à face A e repita a dose com os “OS BEATLES". TONY BARROW
Alun Owen iniciou o trabalho desta original peça para o cinema, não faz muito tempo. O produtor Walter Shenson e o diretor Richard Lester observaram seus mais novos astros da tela atuarem durante o Natal e Ano Novo, no palco do Astoria do Finsbury Park de Londres. John e Paul iniciaram uma coleção de novas composições para a trilha sonora, ao mesmo tempo que "The Beatles" se apresentavam no Olympic de Paris. Uma manhã, algum tempo depois, num trem especialmente fretado, iniciou-se a carreira cinematográfica de "The Beatles". Carretel sobre carretel de precioso filme já enchiam as latas, antes mesmo que fosse selecionado um título para este filme da United Artist. Foi quando Ringo, casualmente, surgiu com o nome ao fim de uma agitada sessão no set de filmagem: "É a noite de um dia duro!" — declarou ele, agachando-se sobre o braço de sua cadeira de lona, atrás das fileiras de câmeras e técnicos. É uma estória que se desenrola dentro das 48 horas consecutivas das atividades de quatro rapazes do grupo dos "beat". São eles: John, Paul, George e Ringo. A canção "A Hard Day's Night" ouve-se logo no princípio do filme, cantada e tocada pelos rapazes, à medida que vão passando as legendas de abertura. Este número apresenta a voz de John dublada, produzindo um efeito de dueto. Seu tema de grande vivacidade e impulsão, brota de forma orquestral de vez em quando. "I Should Have Known Better" se ouve durante uma sequência do trem, quando os quatro rapazes estão jogando cartas no vagão do condutor. John e Paul coparticipam da vocalização em "If I Feel", a primeira de quatro músicas apresentadas em sequência de teatro e estúdio, e que mostram o grupo ensaiando para finalizarem com uma apresentação espetacular numa televisão. "I'm Happy Just to Dance With You", dá uma oportunidade a George de conduzir a parte vocal. Com "I Love Her", Paul evidencia o solo; juntamente com John fazem "Tell Me Why". O último destes magníficos números da trilha sonora é "Can't Buy Me Love"; um sucesso mundial com "The Beatles". Já "A Hard Day's Night" faz o fundo musical para diferentes cenas — quando, por exemplo, os rapazes aparecem perseguidos através de um campo, após uma fuga rápida do estúdio de televisão; e a incrível e furiosa corrida entre os "Beatles", seus fans e a polícia, pelas ruas e alamedas abaixo. Criando e aperfeiçoando inteiramente novas composições para a trilha sonora do filme a que temos nos referido, Paul e John apresentam um dos maiores desafios de sua carreira de compositores de músicas populares. No passado compunham sem qualquer pressa. Há pouco tempo, com programa de trabalho dentro de um horário que lhes parecia cada vez mais curto, e uma coleção de novos números para serem selecionados durante uma série de apresentação em Paris, e ainda com uma lendária visita à América. Para ajudar nos ensaios eles mandaram colocar um piano no seu apartamento do hotel George V de Paris. Em breve a tarefa fora completada e "The Beatles" eram possuidores de nada menos de doze novas composições prontas para o último ensaio. A cada novo estágio de concepção e produção, cuidavam para que o filme não viesse a ser apenas uma, ou mais uma parada de representações de "The Beatles". Afinal de contas, haviam concordado entre eles que o filme deveria retratar as diferentes facetas da personalidade de cada um deles, o mais que possível. Com efeito, o conteúdo cômico foi e é de suma importância; e John, Paul, George e Ringo aproveitaram todas as oportunidades para mostrarem seu senso de humor. Ficou evidente que não mais de seis novas gravações seriam inseridas no filme, pois um maior número deixaria pouco tempo para a ação do enredo. Por outro lado, não parecia muito justo deixar de lado as músicas restantes, quando cada uma delas possuía suas grandes qualidades. Eventualmente, tomaram a decisão de incluir essas peças no lado dois deste disco. Embora a voz de George Harrison esteja bem evidenciada neste LP, a parte vocal no lado dois está equilibrada entre John e Paul, os compositores das canções. Paul canta em "Things We Said Today", e o escutamos em dueto com John em "I'll Cry Instead". Durante a parte principal, a voz de John é a que predomina em "Any Time At All", "When I Get Home", "You Can't Do That" e "I'll Be Back", ainda que George e Paul envidem seus esforços em todas elas. Ao ouvir o lado 2 deste disco, você concordará que seria uma pena se se tivesse deixado de lado tão excelentes músicas, simplesmente pelo fato de não terem entrado no filme. Agora, com este LP você terá uma série de grandes sucessos de "The Beatles", ampla e atual. Ao mesmo tempo, é sempre bom lembrar que este é o primeiro LP com músicas compostas e interpretadas por "The Beatles". TONY BARROW
Este é o quarto LP dos Beatles. “PLEASE PLEASE ME”, “WITH THE BEATLES”, “A HARD DAY’S NIGHT”. Eis os três. E agora... “BEATLES FOR SALE”. Os Beatles à venda. Não quer dizer que os Beatles estejam à venda. Mesmo porque não há dinheiro que pague. Trata-se apenas do LP, e este você pode comprar. O dinheiro não é tudo. Há uma história inestimável entre estas capas. Nenhum de nósestá ficando mais novo. Quando, daqui a 20 anos ou maiscriança, entendidaem música, estiver num piquenique em Saturno, e lhe perguntar quem eram os Beatles - “Você os conheceu à época? - não tente explicar tudo sobre os cabeludos e sua turbulência! Basta à criança tocar algumas faixas deste LP e logo entenderá tudo. Os jovens do ano 2000 extrairão da música mais sensação de bem-estar e ardorque sentimos hoje, porque a mágica dos Beatles, desconfio, não tem limite de tempo nem idade. Ela venceu todas as barreiras. Acabou com todas as diferenças de raças, idades e classes. É venerada pelo mundo inteiro. Este LP tem alguns números agradáveis da música Beatle. Tem, por exemplo, oito novos títulos trabalhados pelos incomparáveis John Lennon e Paul McCartney, e mais 6 números que foram escolhidos da riqueza rítmica da extraordinária década passada, entre elas composições como KANSAS CITY e ROCK AND ROLL MUSIC. Maravilhoso. Muitas horas de trabalho árduo foram gastas na produção deste LP. Não é uma mistura de vale-tudo para ganhar dinheiro. No mínimo, 3 canções de Lennon & McCartney foram seriamente consideradas como lançamentos de compactos simples, até que John apareceu inesperadamente com “I FEEL FINE”. Estas três foram “EIGHT DAYS A WEEK”, “NO REPLY” e “I’M A LOSER”. Cada uma teria estourado os primeiros lugares, mas estão como adorno e um exemplo para outros artistas. Como em outros Lps, os Beatles levaram mais tempo com o sucesso do que o mercado exige normalmente. Há alguns truques de gravação que os Beatles e seu produtor, George Martin, introduziram, com algumas inovações, tais como: Paul num órgão Hammond, em MR. MOONLIGHT, e, pela primeira vez, George Harrison tocando um velho tambor africano, porque o baterista Ringo estava tocando bongô. O tambor de George continuou na trilha sonora, mas o bongô de Ringo foi retirado depois, na mixagem. Ringo toca tímpano, em EVERY LITTLE THING, e na faixa ROCK AND ROLL MUSIC, George Martin junta John e Paul no mesmo piano. Em WORDS OF LOVE, Ringo aparece tocando caixa. Além disso, é um disco confeccionado em 1964. O melhor do seu tipo no mundo. Há pouca coisa ou nada neste LP que não possa ser reproduzido no palco, embora os estudiosos e críticos da música “pop” saibam que nem sempre é o caso. Ei-lo, afinal. Ainda é o melhor LP, inteiramente definido: John, Paul, George e Ringo - cheio de tudo que fez dos quatro a maior atração que o mundo já conheceu. Para aqueles que gostam de saber qual o desempenho de cada um neste LP, há detalhes ao lado,dos títulos e nas músicas. DEREK TAYLOR
“Meu nome é Derek, ou seja, como mamãe me chamava; de fato, não é um grande nome, exceto que é o meu próprio. Gostaria pois de dizer que fui convidado a tecer os comentários para o álbum “Yellow Submarine”. Derek Taylor ex-divulgador |unto à imprensa para os Beatles; ele o foi depois nos Estados Unidos, hoje, ao tempo destas notas, é o seu homem de imprensa para a América. Dêsse modo, quando foi convidado a escrever algumas notas para “Yellow Submarine” concluiu que não só não tinha nada de novo que dizer sobre os Beatles de quem também é ardoroso fã - como o fato de ser muito bem pago por êles não o deixava inteiramente livre para usar de raciocínio crítico imparcial. De qualquer forma, seu desejo mesmo era que o público que se deliciou com “Yellow Submarine” também fosse prestigiado com êste magnífico álbum. Dêsse modo, aqui temos: não comprado, não influenciado, sem retoques, desvinculado, puro e um tanto auspicioso, o comentário dêste álbum Apple/EMI, dos Beatles, por Tony Palmer, do “London Observer” - jornalista e cineasta de nomeada. 
O "ÔLHO-DE-BOI" DOS BEATLES
Se ainda resta dúvida sôbre serem Lennon e McCartney os expoentes máximos da criação musical desde Schubert, o lançamento dêste álbum vem significar uma varrida nos últimos vestígios de vaidade cultural e preconceito burguês com um dilúvio de composições que apenas os incultos deixarão de apreciar, e só os surdos dêle não se aperceberão. Traz o simples título de THE BEATLES (BTX 1005/6), num envol­tório singelamente branco, cujo adôrno são os nomes das canções... e aquelas quatro faces, que para alguns representam a ameaça da juventude de cabelos longos; para outros, a luta desesperada e aparentemente sem fim contra aquêles cínicos — os chamados “superiores”. Nos olhos dos Beatles, bem como em suas criações, vislumbra-se, como num espelho, o frágil e fragmentário da sociedade que os patrocina, representa, interpreta, faz-lhes exigências, e os pune quando fazem o que os outros consideram errado. Paul, sempre esperançoso e pensativo; Ringo, sempre o filhínho da mamãe; George, o “terror local”, hoje “o bom rapaz”; john, ensimesmado, tristonho, mas possuidor de uma inteligência lúcida, não turbada pelo que a moralidade organizada lhe lança à conta. São êles os nossos legítimos heróis, e melhores do que merecemos. Não é como se os Beatles sempre visassem a tal louvor. A qualidade superior das 30 novas canções das alegrias simples da vida dêles. O lirismo de seus versos transborda em fulgurantes lampejos, e tal é seu magnetismo, que é impossível resistir-lhes. Quase tôdas as faixas se conduzem num crescendo; vividas, descui­dadas, indiferentes, leves. O tema varia, desde porcos ("Você viu os mais rotundos leitões/ Em camisas brancas e engomadas”) até o teor daquele filme de sábado à tarde ("£le desistiu da caçada ao tigre com seu fuzil para elefante/Para o caso de acidente, sempre levava a mamãe”); desde (“Porque não o fazemos na estrada") até os (“Fungos comestíveis do Savoy"). A habilidade na orquestração desenvolve-se com precisão calculada. A orquestra inteira, metais, violino, carrilhão, saxofone, órgão, piano, cravo, todo tipo de percussão, flauta, efeitos sonoros; tudo com equilíbrio e, daí, com habilidade. Suprimiram-se, ou melhor, ignoraram- se dispositivos eletrônicos em favor da musicalidade. Referências ou cotações, desde Elvis Presley, Donovan, The Beach Boys e outros, são tecidas dentro duma aura que os tornou os “tapeceiros persas” da música popular. Está tudo aqui, apenas apure o ouvido. Lennon canta “Contei-lhes dos campos de morango” e “Falei-lhes do tôlo lá na colina" — o que resta? Os Beatles são antes habilidosos que virtuosos instrumentistas. Sua execução conjunta, porém, é intuitiva e admirável. Eles dobram e retorcem ritmos e frases musicais, com aquela unânime liberdade que dão às suas aventuras harmônicas; o frenesi da expectativa e do imprevisível. As vozes — e a de Lennon em particular «*- são mais um instrumento: lamentoso, estridente, zombeteiro, choroso. Há uma tranqüila determinação de escaparem da falsa intelectualização que usualmente os cerca e à sua música. A letra é quase sempre deliberadamente simples — assim é a composição Aniversário, que encerra versos como “Feliz aniversário para você"; outra em que é repetido “Boa-noite"; ainda outra expressa: “Estou tão cansado, não consegui pregar o ôlho". A música é, igualmente, despojada de tudo, exceto da mais pura harmonia e ritmo — de sorte que aquilo que resta é um prolífico jôrro de melodia, criação musical de inequívoca clareza e beleza. A ironia e mordacidade que têm emprestado à sua música uma dificuldade e um limite, ainda está borbulhante — “Lady Madonna tentando viver dentro de suas posses — sim/Olhando através de óculos de cebola". A severidade de imaginação é ainda um tanto mais dura: “A águia bica meu ôlho/O verme que corrói meu osso”. “Nuvens negras, negros pássaros; asas partidas, lagartos, destruição". E a mais grotesca, uma extraordinária faixa que se chama apenas Revo­lução 9 e encerra efeitos de som, murmúrios ouvidos ao a£aso, formalis­mo retrógrado, sons discordantes de lembranças subconscientes de uma civilização que se debate. Cruel, paranóica, inflamada, agonizante, sem esperança, é-lhe dada forma pôr meio de uma voz anônima de bingo, que apenas segue repetindo: “Número nove, número nove, número nove”, até que você sente vontade de gritar. A melancolia acumulada reflete-se inteiramente em suas maneiras, como um véu purpúreo de irreal otimismo — fulgurante, inacessível, afetuoso. Por fim, tudo o que você tem a fazer é levantar-se e aplaudir. Qualquer que seja a medida do seu gôsto da música popular, você o satisfará aqui. Se julga qife música popular é Engelbert Humperdinck, creia, os Beatles foram um pouco mais além — sem sentimentalismos, mais apaixonadamente. Se pensa que o popular é rock’n'roll, saiba que êles o aprimoraram ainda — nas praias distantes da imaginação, ainda não palmilhadas por outros. Este álbum lhes consumiu cinco meses para o preparo, e, para o caso de você achar que foi muito lento, saiba que desde sua conclusão até a data destas linhas compuseram outras 15 canções. Nem mesmo Schubert trabalhou nesse ritmo.

3 comentários:

Valdir Junior disse...

Eu nunca entendi o porque de colocarem aquele texto sobre o "Álbum Branco" no "Yellow Submarine".

Camilo Lucas disse...

Nem eu. Sem pé nem cabeça

Marcelennon disse...

Eu ia dizer isso, Valdir...
Realmente é sem pé e nem cabeça, Camilo, mas, como diz o Neto, comentarista de futebol, "é um baaaaaaaaaaaaita" texto!
Rsrsrsrs
Eu me lembro quando comecei a colecionar os discos deles...
Ia por ondem de lançamento (tirando o Rubber Soul, que foi um dos primeiros que adquiri e até hoje é o meu favorito!) e, a cada disco novo, ficava deitado ouvindo as canções, com a capa do LP nas mãos lendo esse texto.
Tempo maravilhoso!
Obrigado, Edu, por resgatar uma época muuuuuuuuuuito boa em minhas lembranças!