sexta-feira, 14 de setembro de 2012

GEORGE HARRISON - THIS IS LOVE

Postagem publicada originalmente em 29 de dezembro de 2010. Faz parte da coluna Arquivos do Fundo do Baú. A matéria saiu na revista "Afinal" de 15 de março de 1988.
É só rock “n” roll – e que maravilha!
Sérgio Vaz
Nesta era de fibra de vidro, continuo procurando por uma pérola, escreveu Bob Dylan em Dirge, de 1974. Seu amigo George Harrison poderia perfeitamente assinar embaixo a mesma declaração de princípios. Seu novo LP, Cloud Nine, que a WEA lançou no final de fevereiro no mercado brasileiro, é um disco extraordinário por diversos motivos – mas, principalmente, porque ele dispensou os aparatos modernosos, virou as costas para tudo que se inventou de tecnopop, despojou-se até (ainda bem) do seu fanatismo místico, e foi direto ao centro da questão, o princípio elementar, a pérola: o velho e bom rock”n”roll. Com direito, é claro, a uma ou outra balada. Tudo limpo, límpido, transparente, feito com competência, garra, paixão, alguma angústia, alguns piques de alegria, maturidade. Nada de massa sonora. Não há massas sonoras – essa praga dos anos 70 que em muitos casos insiste em sobreviver até este final de anos 80 - , nem efeitos de alquimias eletrônicas. “No meu tempo”, disse ele, “usávamos guitarras reais, teclados reais, baterias reais e pessoas reais.”
Deu certo – e não deu certo apenas porque George conseguiu, com este Cloud Nine, criar o melhor trabalho de seus 17 anos pós-Beatles, ao lado de All Things Must Pass, o primeiro, o álbum triplo de 1970. Deu certo também porque, como nunca tinha acontecido nestes anos todos, fez um tremendo sucesso. Em meados de um mês o LP – lançado na Inglaterra e nos EUA em outubro do ano passado – vendeu um milão de cópias e deu a ele seu primeiro disco de platina. (Depois da separação dos Beatles, apenas Paul McCartney tinha conseguido isso.) O que prova que, afinal de contas, havia muito mais gente do que se suspeitava interessada em pérolas e não em fibra de vidro.
É interessante que George tenha conseguido tudo isso – um trabalho belíssimo, marcante, a unanimidade da crítica americana e européia, a consagração popular – quando já ninguém falava dele, depois de cinco anos de absoluto silêncio (Gone Troppo, seu LP anterior, foi malhadíssimo, não vendeu nada e não tocou no rádio; “pra que fazer música se não vai tocar?”, ele se perguntou, durante esse intervalo de cinco anos). Parece mais uma peça que se ajusta perfeitamente nesse quadro estranho que é sua carreira. Durante oito anos como Beatle (e cada dia da época em que ele era um Beatle equivalia a dez anos, como ele diz agora), ele foi massacrado pelo poder e pelo talento transbordante da dupla central; para cada 13 composições de Lennon & McCartney, ele conseguia gravar uma sua. No álbum Branco, de 1968, por exemplo, conseguiu o feito inédito de gravar quatro músicas de sua autoria – só que contra 26 de Lennon & McCartney. Talvez por isso, pelo fato de ter tido criatividade represada, ele tenha partido, ainda em 1970, o ano da dissolução do conjunto, para o exagero do álbum triplo – lançando poucos meses depois, em 1971, outro álbum triplo, The Concert for Bangladesh, ainda que dividindo a cena com amigos como Bob Dylan. Depois desse começo copioso e competente, no entanto, o compsitor entrou meio em recesso, lançando apenas duas ou três boas canções em cada um dos LPs que se seguiram, até Gone Troppo, 0 11º da carreira solo. Eram, na maioria, trabalhos pouco criativos, sem brilho, e encharcados de misticismo.
Os cinco anos de silêncio – longe do carrossel, como diria John Lennon – fizeram um tremendo bem a George Harrison. (Coincidente ou emblematicamente, John Lennon também teve exatos cinco anos de silêncio entre Rock”n”Roll e seu retorno no esplendor da maturidade em Double Fantasy, de 1980.) Depois de cuidar de plantas em sua mansão e andar perdendo dinheiro produzindo filmes, George resolveu reunir alguns velhos amigos no estúdio que tem em sua casa: Ringo Starr na bateria, Eric Clapton na guitarra (“nós nos entendemos bem, até dividimos a mesma mulher”), Elton John no piano, Gary Wright (ex-Spooky Tooth) nos teclados e Jeff Lynne (ex-ELO) na guitarra, baixo, produção e co-autoria de várias músicas. O resultado foi um dos grandes discos da história do rock. Bob Dylan – citado no verso “it’s all over now, baby blue”, na deliciosa When We Was Fab – seguramente concorda. John Lennon – homenageado na mesma música com citações de seu I Am the Walrus – seguramente concordaria.


4 comentários:

Lidiane Pessoa disse...

Meu dia começando agora... e começa aqui no Baú... com o George, tudo de bom! adorei o post Edu! ADORO quando você publicada essas matérias antigas, me dá por um instante a sensação de voltar pra um tempo que não vivi, ou melhor... do qual não lembro, nesse caso porque tinha menos de 1 ano ainda... Viva ao Baú!!!!

João Carlos disse...

Maravilha! Sensacional EDU!Manda mais,porque se melhorar piora!

Renata L. disse...

Amei o post! Também adoro essas matérias antigas, muito bacana!
Edu vc já fez algum post falando sobre Brainwashed, o ultimo álbum o George?

Jeniffer disse...

muito bom! Adoro ver matérias antigas em revistas brasileiras do meu George.