sábado, 10 de abril de 2010

ESPECIAL - 40 ANOS DO FIM DOS BEATLES


Há 40 anos, no dia 10 de abril de 1970, Paul McCartney anunciava a separação oficial dos Beatles em comunicado. Pouco tempo depois, John Lennon concluía: o sonho havia terminado. Na realidade, o grupo já tinha deixado de tocar juntos havia vários meses, quando terminou a gravação do álbum Abbey Road. Os quatro já estavam se dedicando a projetos pessoais, mas ninguém se atrevia a anunciar ao mundo a separação. — Não deixei os Beatles. Os beatles deixaram os Beatles, mas ninguém quer ser o que diz que a festa terminou — afirma Paul na autobiografia do grupo, Anthology. Em abril de 1970, Paul lançava seu primeiro disco solo, McCartney, e queria evitar entrevistas nas quais, sem dúvida, seria perguntado sobre a situação dos Beatles. O baixista decidiu que Derek Taylor, assessor de imprensa do grupo, prepararia um questionário, que seria respondido por ele distribuído junto com seu disco.
— Uma das perguntas foi: podemos dizer que os Beatles se separaram? Respondi: Sim. Não voltaremos a tocar juntos — lembra. Paul estava furioso com o trabalho feito pelo produtor Phil Spector com as fitas que o grupo tinha deixado paradas no ano anterior e que foram retrabalhadas e lançadas no álbum Let it Be. O trabalho de Spector foi aprovado por John e George Harrison, que não queriam que Paul lançasse seu álbum pela Apple Records — o selo criado pelo grupo — antes que Let it Be e o disco de estreia de Ringo Starr começassem a ser vendidos. — Estava tão cansado de tudo que disse: 'Quero sair do selo'. A Apple Records era um lindo sonho, mas pensei: 'Quero deixá-lo'. George me disse por telefone: 'Você vai ficar no selo! Hare Krishna!' e desligou — lembra Paul. Paul afirma que o grupo chegou ao seu fim "quando John disse: "estou saindo! Quero o divórcio". Lennon já atuava junto com Yoko Ono em seu próprio grupo, o Plastic Ono Band, com o qual tinha lançado um álbum ao vivo, e, em janeiro de 1970, tinha gravado a música Instant Karma, com George e Spector. Ringo afirma que, antes do anúncio de Paul, sempre havia a possibilidade de os Beatles continuarem juntos. — Quando estávamos no estúdio gravando 'Abbey Road' não dissemos: 'acabou: último disco, última canção' — assegura o baterista. Mas a separação dos Beatles era inevitável. Como explica George Martin, o produtor que trabalhou com eles no estúdio de gravação durante oito anos, "a ruptura ocorreu por muitos motivos, sobretudo porque cada um dos meninos queria viver sua própria vida e nunca tinham conseguido".— Acho que nos separamos pelo mesmo motivo pelo qual as pessoas se separam. Precisávamos de mais espaço vital e os Beatles tinham se transformado em um espaço reduzido — afirma Harrison na autobiografia do grupo.

Os quatro integrantes da banda seguiram seus caminhos separadamente, mas nunca deixaram de ser perguntados sobre um possível retorno, opção que foi descartada depois que John foi assassinado em Nova York, no dia 8 de dezembro de 1980.

Em 1980, Paul McCartney trabalhava em seu álbum "Tug of war". Durante a gravação - que marcava o seu reencontro com George Martin onze anos após "Abbey Road" - no dia 8 de dezembro, John Lennon foi baleado por Mark Chapman em Nova York. A faixa-título do disco de McCartney dizia o seguinte: "Esperávamos mais / Mas, de um jeito ou de outro, tentávamos superar um ao outro num cabo de guerra". Além da guerra de egos entre os dois, outros fatores deram cabo à banda que revolucionou a história da música. A morte do empresário Brian Epstein, em agosto de 67, foi um deles. "Ele era um de nós", disse Lennon ao "New Musical Express". A presença de Yoko Ono também foi decisiva.

"A morte de Epstein deixou os rapazes meio sem pai. Acho que isso contribuiu para John entrar em um estado de desamparo que possibilitou que Yoko dominasse o pedaço. A relação entre o Paul e o John também já estava desgastada. Eles eram muito amigos, mas a amizade azedou por causa da vaidade pessoal e do dinheiro", afirma Elaine Gomes, autora do livro "The Beatles - Letras e canções comentadas".

A guerra de egos já acontecia, pelo menos, desde 1968. Nas gravações do "Álbum branco" (ou o "Álbum tenso", segundo McCartney), cada Beatle tratava o colega como músico de apoio. O estopim aconteceu no estúdio de Twickenham (período que George Harrison chamou de "o inverno do descontentamento") para a gravação do filme "Get back", no ano seguinte. Ao invés de canções brotando como mágica, brigas eram detonadas a todo instante. "Quase todas foram iniciadas por McCartney, que continuava a agir como se estivesse tentando roteirizar o filme, ao levantar questões como a mudança da visão de mundo dos Beatles desde a morte de Epstein", escreveu Jonathan Gold em "Can't Buy Me Love".

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Decepcionados com "Get back", os Beatles voltaram aos estúdios. "Abbey Road", trazia a banda como nos velhos tempos em que tocava nas pocilgas de Hamburgo. John, Paul e George castigaram suas guitarras, enquanto a Ringo foi concedido o direito de fazer o seu primeiro solo de bateria em uma gravação dos Beatles. Mas tudo terminou por aqui. "I me mine", última faixa gravada pelos Beatles (para "Let it be", com o registro daquelas sessões de "Get back"), nem contou com a presença de Lennon.

A morte de Epstein já havia esquentado o clima antes. "Não tinha ilusões quanto ao fato de que só sabíamos fazer música e nada mais", disse Lennon a Jann Wenner, autor do livro "Lennon remembers". Após a perda, os Beatles ainda fundaram a Apple, mistura de gravadora e produtora de filmes. Preocupado com as finanças, McCartney contratou o sogro, Lee Eastman. Lennon, Ringo e George ficaram com Allen Klein, empresário não muito confiável e que cuidava da carreira dos Rolling Stones.

Com relação à Yoko Ono, teria ela força suficiente para causar a separação dos Beatles? Marcelo Fróes, pesquisador musical e produtor de diversos CDs com a obra dos Beatles interpretada por artistas brasileiros, acredita que a influência não foi tão decisiva. "Se houve influência, certamente foi para apurar a sua criatividade. Ela deve ter alfinetado as picuinhas entre os dois líderes da banda, que podem ter ficado piores depois que Brian Epstein morreu", afirmou. Os integrantes dos Beatles nunca deixaram claro até que ponto chegou tal influência. "Quando o John se amarrou tão intensamente nela, ficou óbvio que era um ponto sem volta. Sempre achei que ele tinha que se desligar da gente para dar atenção a ela", disse McCartney no projeto "Anthology".

O próprio John Lennon reconheceu, na biografia "John Lennon - A vida", de Philip Norman, a importância de Yoko no episódio. "Quando conheci Yoko foi como quando a gente encontra a sua primeira mulher e abandona os caras do bar. Assim que a encontrei, foi o fim dos rapazes. Mas acontece que os rapazes eram muito conhecidos, não eram apenas os caras do bar." Bob Spitz, autor de "The Beatles - A biografia", detalhou a presença de Yoko no seio da banda. "Entre a gravação de uma música e outra, John ficava cochichando com Yoko e perdia o momento em que devia entrar em uma música." Por causa da insuportável presença da mulher de Lennon no estúdio ele e George Harrison sairiam literalmente no tapa durante as intermináveis gravações de Let It Be.

De fato, John Lennon estava com pressa para entrar em estúdio com a sua esposa. Ele e Yoko já faziam shows juntos, e o álbum "Two virgins" foi gravado antes mesmo da separação oficial dos Beatles. Deprimido, McCartney seguiu caminho idêntico. "Estou fazendo o mesmo que você e lançando um álbum. E também estou saindo do grupo", disse. Paul explicou o motivo da decisão a Philip Norman: "Eu não podia deixar John controlar a situação e nos jogar fora como namoradas chutadas".

Além da guerra de egos, da morte de Brian Epstein e da presença de Yoko Ono, muitos consideram que, além de tudo isso, o que fez com que os Beatles terminassem foi a necessidade deles quatro, individualmente, transcenderem. A partir do 'Álbum Branco', eles começavam a deixar de ser uma unidade, uma banda, e passavam a ser um conjunto de quatro artistas maravilhosos, mas com características que ficavam cada dia mais diferentes. O fato de terem uma banda, fazia com que John, Paul, George e Ringo limitassem as suas capacidades criativas. Eles precisavam de mais liberdade para poder criar, seguir seus impulsos artísticos e musicais próprios, individualmente, sem ter de se condicionar aos outros.

Após tantos lançamentos envolvendo a grife "The Beatles" no final do ano passado, Paul McCartney colocou nas lojas "Good evening New York City". No álbum, que traz um show no antigo Shea Stadium (local de uma das apresentações mais memoráveis dos Beatles), surge a canção "Here today", gravada em homenagem a John Lennon também em "Tug of war". "Eu ainda me lembro como foi antes / E não estou mais segurando as lágrimas", diz a letra. A essa altura, o sonho já havia acabado. Pela segunda vez.

2 comentários:

Unknown disse...

Legal o post!
Acredito que cada um seguiu SEU próprio sonho.

Marco disse...

Ninguém está preparado para o fim, seja ele qual for. Vejo a história como o encontro dos quatro elementos, um vital para o outro e ao mesmo tempo impossível de ocuparem o mesmo espaço. Sim, o sonho acabou para eles. Para nós recomeça a cada instante, a cada acorde, a cada post. E muita história ainda vai rolar, pois esta é uma saga sem fim.