segunda-feira, 29 de novembro de 2010

OS ARQUIVOS DO FUNDO DO BAÚ - Nº 05

Este artigo foi publicado na revista SOM TRÊS de setembro de 1979. É um review assinado por Ana Maria Bahiana, sobre o lançamento do álbum George Harrison.


Nove anos de música na vida do jardineiro George

"Não consigo pensar na minha vida como uma carreira, hoje. Gosto de música, de tocar minha guitarra, mas é só isso. Acho mais importante ficar com meu filho, minha mulher e cuidar do meu jardim. Me considero, basicamente, um jardineiro".


Há jardins na casa de George Harrison (WEA) e de All Thing Must Pass (EMI). E nove anos separando um do outro. Na recente e curtíssima – e curtíssima – passagem pelo Brasil, George não falou em nenhum dos dois – embora, teoricamente, tenha vindo divulgar o segundo – mas do tempo dos jardins e dos Beatles. Havia uma sensação estranha em olhar aquele homem muito velho para seus 36 anos, muito sereno para quem viveu tudo que viveu: a sensação de que todos ali – jornalistas, fotógrafos, ele mesmo – estavam vivendo uma fantasia, uma trip, uma irrealidade, que estávamos todos representando uma entrevista com frieza e profissionalismo, porque não podia ser verdade. Não é mesmo, George Harrison realmente não existe, é uma imagem de celulóide, uma impressão numa folha de jornal, uma voz sem corpo numa caixa acústica.
Em algum ponto da entrevista você percebe que ele sabe disso. Que olha a si mesmo de fora, e sabe que não tem, na verdade, carreira nenhuma a manter, imagem nenhuma a cultivar, que já tinha provado tudo que precisava provar e deixado a si mesmo lá atrás, lá longe, como a casca de uma cigarra.
E, no entanto, ele faz discos. Talvez porque tenha passado os últimos seis anos - espaço que separa seu derradeiro bom álbum. Living in the Material World, deste último George Harrison – caminhando para longe de si mesmo, do personagem que foi, ele tem feito em sua maioria discos ruins, monótonos, desleixados. E talvez porque tenha chegado ao ponto em que realmente, o que foi não importa, ele faz agora, um álbum magnífico em sua simplicidade, repleto de hits certeiros, como “Blow Away”, “Love Comes to Everyone”, “Here Comes The Moon”( a antítese de “Here Comes The Sun”) e canções belíssimas, continuadoras de uma linhagem inaugurada com “Something”, “Dark Sweet Lady”, “Your Love is Forever”, “Soft Touch”. Música comercial de primeira linha, como em síntese, os Beatles sempre fizeram. Executada com maestria de alguém que conhece todas as intimidades do estúdio, esse velho amigo.
Há um ciclo se fechando entre Harrison e All Things Must Pass, o álbum triplo que está sendo relançado no Brasil. All Things é o primeiro passo fora, e por isso é raivoso, abundante, majestoso, jorrando como uma hemorragia – ou como uma dor de barriga, como, candidamente, o próprio George o comparou. É seu melhor disco, e um dos melhores discos feitos nos anos 70. Está repleto de clássicos – “If Not For You”, “Beware of Darkness”, “I’d Have You Anything”, “Isn’t It a Pity”, “My Sweet Lord” – e com uma dinâmica diabólica em cada faixa – “What Is Life”, para citar o exemplo máximo. A guitarra não é genial, mas tem estilo, bom gosto, leveza. A voz é bruxulenta, mas George sabe como gravá-la e fazer dela a sua assinatura. George é, acima de tudo, inventor de melodias – e assim sobreviverá a si mesmo e será encontrado em plena forma, nove anos depois. Aí já é o fim de uma estrada, o começo de outra. Sentado sobre uma pedra, olhando para trás, pacificamente, e não mais no meio daquele descampado, os quatro anõezinhos caídos no chão, aquele olhar de “viram o que aconteceu?”. Todas as coisas devem passar.
E George veio, George foi, George falou e parecia que não era ele, e talvez não fosse, mas isso já não faz diferença. George não tem nenhum motivo para fazer música, nem boa nem má, nem para ganhar dinheiro. Mas faz. Nada mau para um jardineiro. Ana Maria Bahiana

DOWNLOAD:
http://www.4shared.com/file/2xs1KIQI/GH_GH_1979_obaudoedublogspotco.html

4 comentários:

João Carlos disse...

Este disco é soberbo.

Edu disse...

Também acho!

Anônimo disse...

Pra mim é o melhor disco do George Harrison, junto com Imagine e Tug of War os melhores pós Beatles. Esses discos tem todas as músicas maravilhosas.

Luiz Lennon disse...

amigo edu
veja meu blogger.wwww.beatlescavernclub.com.br
gostaria de ter autorização para publicar textos seus em meu blogger, logicamente citando a fonte.

me avise,ok.