Por Hagamenon Brito - correio24horas.com.br
As eternas dúvidas de personalidade. Levamos uma vida a ser quem os outros querem que sejamos, ou melhor, o que os outros pensam que somos. Acontece que na vida dos pobres mortais amanhã é outro dia e a vida, com todas as suas contas a pagar, afetos e contradições de mesas de bar e, agora, redes sociais, continua a nos chamar. Bem diferente e infinitamente mais complexa é a situação de um mega star como o cantor e compositor inglês Paul McCartney, 75 anos, uma das maiores referências da música e da cultura popular desde os tempos dos Beatles, nos anos 1960. E aí chovem linhas, promovem-se mentiras e contam-se histórias nem sempre confortáveis - e isso muito antes do surgimento da internet. A tênue linha de (des)entendimento de Paul e John Lennon, por exemplo, nos foi revelada, também, pela mão do grande e premiado jornalista Philip Norman, 74, no livro Shout! The Beatles in Their Generation, em 1981. Episódio importante para entender melhor Paul McCartney - A Biografia (Cia das Letras | R$ 89,90/papel | R$ 44,90/e-book | 824 páginas). Na biografia Shout! sobre a banda, inédito até hoje no mercado editorial brasileiro, um passional Philip Norman descrevia os Beatles como resultado da genialidade musical de Lennon (“John Lennon era três quartos dos Beatles”), enquanto McCartney era considerado o homem das circunstâncias, pseudo porta-voz dos Beatles, mas que não passava de uma estrela pop de talento razoável. Tais afirmações não caíram bem a McCartney, claro, numa digestão que se adivinharia adversa a qualquer mortal. Por isso, o próprio Norman, autor de livros também sobre John Lennon, Rolling Stones, Mick Jagger e Elton John, ficou surpreso quando pediu a McCartney autorização para escreveu a sua biografia e este não lhe esticou o dedo do meio. Daí a achar que Sir James Paul McCartney - que faz show dia 20 de outubro, na Arena Fonte Nova -, iria estender a mão, esperar que Philip Norman apertasse o play do gravador e lhe contasse a vida toda vai uma distância. Seria bom-mocismo demais, convenhamos. O que o músico fez foi autorizar e não colaborar diretamente, ou seja, o escritor teve que recorrer a amigos e familiares do biografado para recolher testemunhos. Em certa medida, Paul McCartney - A Biografia é uma espécie de redenção de Norman, onde ele aponta o espelho para um homem maior, cujo caráter mediano, sempre seguro em seus atos e com “talento pop razoável”, são coisas do passado, equívocos do próprio autor. McCartney agora aparece em toda a sua plenitude e complexidade - de artista de enorme talento musical a homem de família e empresário, com a dor de aguentar a morte da mãe enquanto jovem, superada por um pai que o atirou para o mundo onde, afinal, se revelaria dono e senhor. Também se aborda a quase morte de Paul na África, os nove dias de prisão em Tóquio, em 1980, por porte de maconha (com medo de ser estuprado, ele cantava seus hits para ganhar a amizade dos outros presos) e a complicada relação com Lennon. A humanização do biografado é uma das maiores qualidades da obra. Tido como um eterno bom-moço, Paul é tão fascinante quanto complexo e Norman aborda os traços fortes de autoritarismo e autopromoção na personalidade do artista, bem como o sexismo dos Beatles e a avareza do mais célebre dos seus sobrevivente. Se é verdade que ele e Yoko Ono até hoje se detestam, mais curioso é saber que Paul fumou maconha diariamente até depois dos 60 anos. Parou para não dar mau exemplo à filha pequena, Beatrice, hoje com 13 anos. E saber também que a união de três décadas com Linda (1941-1998), sua mulher mais famosa, não era um mar de rosas como se imaginava. Paul, por exemplo, interrompeu um projeto de autobiografia de Linda com o argumento de que na família só existia uma estrela: ele. Foi mesquinho, no mínimo. Mas, como diria o filósolo alemão Friedrich Nietzsche, tudo é humano, demasiadamente humano. Paul McCartney, senhores, merece todo o respeito e admiração. No livro Paul McCartney - A Biografia, o Philip Norman conta que o músico foi tomado por uma grande insegurança nos anos seguintes à separação dos Beatles, chegando mesmo a ficar depressivo. Nessa fase, em que contou com o apoio fundamental da esposa e companheira da banda Wings, Linda, ele acreditava que não conseguiria fazer sucesso sem John Lennon, Ringo Starr e George Harrison. Logo, ao estrear solo, ele veria que estava errado, algo que o tempo, os fãs e a crítica reforçariam diante da qualidade pop de canções como Another Day, My Love, Jet, Live and Let Die, Mrs. Vandebilt e Let’em In. Todas elas presentes na ótima coletânea Pure McCartney, de 2016, com 67 canções da carreira do ex-Beatle desde seu álbum de estreia solo, editado em 1970, e escolhidas pessoalmente por ele. “Surgiu a ideia, minha e da minha equipe, de reunir uma coleção das minhas gravações tendo somente em mente ter algo divertido para escutar”, disse o cantor sobre este projeto. Entraram também gravações recentes de Paul, Save Us, do ótimo álbum New, de 2013; o remix de 2015 de Say Say Say (sua parceria com Michael Jackson); e Hope for the Future, de 2014, incluída no videogame Destiny. “Fico satisfeito, e frequentemente me surpreendo, que tenha me envolvido na composição e gravação de tantas canções, cada uma delas tão diferentes das outras”, acrescentou McCartney após analisar seu repertório. Juntando Beatles e sua carreira solo, estima-se que Paul já vendeu 700 milhões de álbuns.
2 comentários:
Quero ler esse livro, então.
Paul, inteligente como ele é e sabendo a importância desse biográfico deu um aceno pra ele.
Não li ainda, mesmo porque tá muito cara essa edição, mas duvido que esta biografia traga algo de revelador sobre o Paul.
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