Como última faixa de Revolver e indicador mais claro do que estava por vir, muitas vezes presume-se que "Tomorrow Never Knows" tenha sido a última faixa gravada para o álbum Revolver, de 1966. Na verdade, foi a primeira. Sem dúvida a composição mais estranha e experimental dos Beatles até então, foi uma tentativa de John Lennon de criar em palavras e sons uma faixa-guia adequada à experiência com LSD. As palavras foram emprestadas, adaptadas e embelezadas do livro The Psychedelic Experience (1964), de Timothy Leary, que, por sua vez, era uma reinterpretação poética do antigo Livro Tibetano dos Mortos. John recebeu o livro de Barry Miles, amigo dos Beatles, que cuidava da Indica Books em Southampton Row e era uma figura influente na cena alternativa britânica nos anos 1960. Ele tinha um acordo com os Beatles de mandar livros, revistas e jornais importantes para mantê-los atualizados.
Timothy Leary, conhecido como papa do LSD, havia passado sete meses no Himalaia estudando o budismo tibetano com Lama Govinda. The Psychedelic Experience foi resultado direto dessa fase de estudos. "Eu fazia perguntas ao Lama Govinda e depois tentava traduzir o que ele tinha dito para algo útil para as pessoas. O Livro dos Mortos na verdade significa o 'Livro dos Mortais', mas é o seu ego, não o seu corpo, que está morrendo". O livro é um clássico. A Bíblia do budismo tibetano. O conceito do budismo é o vazio e alcançar o vazio - foi o que John Lennon captou na música.
As palavras do Livro Tibetano dos Mortos foram escritas para serem proferidas para um moribundo para guiá-lo pelos estados de desilusão que vem com a aproximação da morte. Muitas pessoas viveram a experiência da morte do ego quando tomaram LSD, então as palavras poderiam ser empregadas para manter os usuários na linha e protegê-los dos horrores. Acredita-se que Lennon fez uma fita com as palavras de Leary para escutar com fone de ouvido enquanto se drogava em casa, ou quando raramente saía dela. O título provisório da faixa era "The Void", tirada da frase de Leary "Beyond the restless flowing electricity of Life is the ultimate reality - the void" ("Além do fluxo inquieto da eletricidade da Vida está a realidade final - o vazio). O título final, assim como "A Hard Day's Night" foi um chavão de Ringo Starr adotado por Lennon porque conferia leveza ao que de outra forma poderia soar como uma jornada desoladora rumo ao nada.
O som da faixa, que consiste em loops de fitas que cada um dos Beatles fez com fade in e fade out, foi surgindo com as experiências de Paul McCartney com seu próprio gravador. "Ele tinha um Grundig. E descobriu que movendo o cabeçote de apagamento e ativando o loop podia encher a fita com um único ruído. Ficava girando até que a fita não conseguisse mais absorver nada, então ele a trazia e tocava", disse George Martin.
Lennon queria que sua voz soasse como um coro de monges tibetanos entoando um cântico do alto de uma montanha. "Ele queria ouvir as palavras, mas não queria se ouvir", disse George Martin. O resultado, que faz parecer que ele está cantando no fim de um longo túnel, foi obtido inserindo a voz através de um alto-falante Leslie.
"Tomorrow Never Knows", é uma das maiores viagens psicodélicas já registradas, tamanha a ousadia para a época. A inclusão de uma espécie de mantra em que a sua letra fala sobre desligar a mente é uma alusão direta aos alucinógenos e sensações ligadas ao ácido. O resultado da faixa foi parceria de Lennon que escreveu a letra e idealizou quase totalmente, e do assistente de produção Geoff Emerick que microfonou os instrumentos e conseguiu tirar um efeito bem interessante da voz de Lennon através de uma façanha com um amplificador, além de acrescentar todos os loops gravados pelos Beatles individualmente. "Tomorrow Never Knows" foi gravada nos dias 6, 7 e 22 de abril de 1966 no estúdio 2 da EMI em Abbey Road. Foi produzida por George Martin e teve Geoff Emerick como engenheiro de som. Além de Revolver, aparece nos álbuns Anthology 2 e Love. John Lennon faz os vocais, toca o órgão Hammond e Mellotron além de loops de fita; Paul McCartney toca baixo e loops de fita; George Harrison toca cítara, tambura, guitarra solo e loops de fita; Ringo Starr toca bateria, pandeiro e loops de fita; e George Martin toca piano.
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