quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

O DIA QUE A BAKER STREET FICOU MAIS BONITA

Publicada originalmente em 7 de dezembro de 2013.
Há 49 anos, exatamente no dia 7 de dezembro de 1967, a Apple foi aberta oficialmente na Baker Street, em Londres. Novamente, os Beatles mostraram ao mundo o quanto estavam na frente. Com um projeto ousado e inovador, ao fachada do prédio, tão tradicional e careta como tudo em Londres, ganhou uma pintura maravilhosa e arrojada, projetada pelo grupo de designers “The Foll”. Infelizmente, a feta não durou muito tempo não. Por isso, a gente relembra agora, uma das primeiras postagens do Baú do Edu, de novembro de 2008. Abração em todos e desculpem a ausência dos últimos dias.
Durante o fim de semana de 10 a 12 de novembro de 1967, enquanto os Beatles estavam preocupados em gravar o vídeo de seu novo compacto, "Hello Goodbye", The Fool começaram a pintar a antiga fachada de tijolos da loja, armando um andaime e envolvendo-o com encerados, de modo que o trabalho pudesse ser feito em sigilo. "Eles se recusavam a dizer a qualquer um de nós a aparência que a fachada teria" diz Alistair Taylor. Ninguém, com exceção dos estudantes de artes contratados para executar o painel, tinha permissão de espiar o trabalho em curso. Até os Beatles eram mantidos a distância, como normalmente se faz com crianças ávidas de curiosidade. "Quando finalmente chegou a hora de tornar público o trabalho, todos nós nos juntamos na rua. O encerado caiu de maneira dramática e, sob ele, estava um incrível mural psicodélico na fachada do pequeno edifício, um autêntico gênio de dois andares, com estrelas, luas e fadas e coisas desse tipo. Minha nossa! Nós ficamos absolutamente pasmados. Era fabuloso! As pessoas debruçavam-se das janelas dos prédios e dos ônibus para olhar. Qualquer motorista que entrava na rua quase batia no carro da frente, cujo chofer também tinha parado para olhar.
"A pintura era maravilhosa", disse Paul, fazendo eco à opnião compartilhada pelos demais Beatles com a maior parte do público. Na cidade toda, o mural da butique da Apple tornou-se assunto de conversa. Londres jamais vira algo parecido. As pessoas vinham de todos os bairros para observar melhor, obstruindo a calçada em frente à loja, congestionando o tráfego. Ela se tornou tão popular como atração turística como qualquer um dos pontos turísticos tradicionais. Porém, a comissão de planejamento da City of Wesminster, à qual tinha sido requerida a permissão oficial para pintar a fachada - ignorando-se se ela havia ou não dado a resposta -, não mostrava muito entusiasmo com isso tudo. 'Não demorou muito tempo para que fôssemos chamados pelos advogados do poder público, que disseram que teríamos de devolver ao prédio a antiga aparência", lembra Taylor. Seguiram-se três semanas de uma acalorada disputa na justiça, até que, finalmente, o mural foi apagado pelos The Fool. O "The Fool", era um grupo de designers holandeses que fez diversos trabalhos para os Beatles. Os mais famosos foram a fachada da Apple, o Rolls Royce de John Lennon, e os muros externos da casa de George, em Esher. Além dos desenhos das roupas psicodélicas que eram vendidas na butique.
http://bestclassicbands.com/wp-content/uploads/2015/07/
Em seus primeiros tempos nos Beatles, John Lennon era um tory, tendo sido levado a acreditar — como tantas pessoas — que o Partido Conservador era o mais bem preparado para o poder. Somente eles tinham a forma­ção e a classe para o cargo, qualidades ausentes em todos os outros. Posteriormente, John mudou de lado, passando a se considerar trabalhista. Contudo, é claro, em se tratando de Lennon, só poderíamos esperar algum tipo de contradição em seu pensamento.O dinheiro foi uma obsessão para Lennon des­de cedo, dominando boa parte de sua vida co­mo Beatle. Para ele, a música pop era a nova e melhor maneira de ganhar grana. Era uma “forma moderna de sucesso”. Em 1964, ao ser indagado se ele se considerava um bom exem­plo para a juventude, Lennon respondeu: “Só em termos de ganhar dinheiro rapida­mente, o que, a meu ver, é um bom exemplo”.Em 1965, cercado pelos outros mem­bros da banda, John declarou à revista Play­boy:  “Em primeiro lugar, nós somos ganha­dores de dinheiro; depois somos artistas”. Ringo o corrigiu. Ainda era considerado in­conveniente falar de forma tão descarada a respeito de dinheiro. “Somos artistas em pri­meiro lugar, John.”“É isso mesmo, lógico”, John respondeu apressadamente, para depois tentar encobrir sua maneira de pensar: “A imprensa leva você nesse sentido, então você fala assim porque é isso que eles gostam de ouvir”. Sim, até parece.Em 1966, na famosa entrevista ao Evening Standard — na qual John declarou que os Beatles eram mais populares que Jesus Cris­to —, John mostrou sua casa à jornalista Maureen Cleave, orgulhosamente apontan­do suas novas aquisições. A seguir, o líder dos Beatles e a repórter foram dar um passeio. No automóvel, Lennon mostrou a Cleave os luxos do veículo, como televisor, cama dobrável, geladeira, escrivaninha e telefone. Caso quisesse, Lennon poderia comandar seus negócios do banco traseiro de seu Rolls-Royce. Lennon reclamou do telefone e informou à jornalista que, apesar das inú­meras tentativas, somente conseguira com­pletar uma ligação do carro. A tecnologia ainda não o conquistara. Depois Lennon ligou o automóvel e le­vou Cleave para passear pelas estradas do in­terior. Enquanto rodavam pelo cenário verde de Surrey, ele se descreveu como “famoso e cheio da grana”. E também con­fessou que, apesar dos enormes ganhos, vivia preocupado com dinheiro. Mesmo com os contadores lhe falando que as finanças estavam seguras e estáveis, morria de medo de esbanjar tudo até os 40 anos, explicando assim sua recente decisão de vender alguns de seus carros. Contudo, ele então re­velou que, quando lhe falaram que não havia a menor necessidade de ter feito isso, ele os comprou de volta. O dinheiro para Lennon representava poder, e unica maneira de um homem como ele conseguir tal poder seria, nascer numa família rica ou trabalhar muito. Então, exibindo o bom senso político pelo qual ficaria famoso na década de 70 ele argumentou, que, no fim das contas, o governo era o único que ganhava. “Aquela piada sobre manter os trabalhadores ignorantes continua verdadeira; foi isso que falaram sobre os conservadores, os latifundiários e tal; depois os trabalhistas pretendiam educar os operários, mas parece que não fazem mais isso.” Um ano mais tarde, seu raciocínio, bem como o dos outros da banda, mudara radicalmente, afetado pela exposição a ideias anticapitalistas radicais, pelo uso generoso de LSD e pela meditação. De repente, emergiu a crença profundamente arraigada de que ele era de esquerda, o que ajudou a contribuir com o novo ideal utópico do grupo, a Apple. A Apple foi inaugurada em 1967, no dia em que a empresa de contabilidade Bryce Hammer & Co. disse que eles poderiam entrgar três milhões de libras esterlinas ao governo britânico ou usá-los consigo mes­mos. Eles preferiram a segunda opção e decidiram criar uma organização para trans­formar em realidade as ideias das pessoas; Quer fosse um livro, um filme, uma canção; Ou até mesmo uma engenhoca, se o grupo gostasse, daria dinheiro para o projeto ganhar vida. E não era só isso. A Apple não utilizaria a tradição comercial, mas estabeleceria - um modelo alternativo às empresas capitalistas. O primeiro empreendimento foi no mundo da moda. Parte do dinheiro havia sido empregada para adquirir imóveis na esquina da rua Baker Street com a Paddington, na região londrina da Marylebone. Os escritórios da Apple foram instalados no último an­dar, enquanto o pavimento de baixo foi trans­formado em loja, batizada de Apple Boutique. O grupo deu ao coletivo “The Fool” cem mil li­bras para desenhar e produzir uma coleção de roupas e decorar o lado de fora do prédio. Eles criaram um design incrível — que durou apenas algumas semanas, pois a aristocracia de Londres exigiu que fosse removido. Lennon, que compra­ra para o amigo Pete Shotton um supermerca­do na ilha Hayling, no condado de Hampshire, lhe deu o cargo de gerente da Beatle-Boutique. Contudo, o local não seria apenas uma loja de roupas. Também seriam vendidos li­vros, discos, objetos de decoração e tudo que chamasse a atenção. Paul queria que a loja vendesse porcelana branca, difícil de encon­trar em Londres, enquanto George, é claro, queria a venda de objetos esotéricos. Jenny Boyd, irmã de Pattie, conseguiu emprego lá. Uma festa foi realizada no dia 6 de dezembro de 1967, a que John e George com­pareceram comendo maçãs ruidosamente, e no dia seguinte a butique abriu as portas. Foi um sucesso a princípio, com as pessoas gastando muito na proximidade do Natal. Contudo, em meados de janeiro, a realidade bateu à porta. As criações do Fool eram im­pressionantes e individuais, mas não foram produzidas nos tamanhos padrão da moda. Os potenciais compradores simplesmente não conseguiam vesti-las, ou sequer pagar por elas. A loja começou a perder tanto dinhei­ro que McCartney interveio e pediu a John Lyndon, ex-funcionário da NEMS e produtor teatral, que ele arrumasse a casa. Lyndon aceitou e correu atrás de roupas acessíveis e financeiramente viáveis. Em julho, a missão estava começando a se firmar quando, du­rante uma reunião nos novos escritórios da Apple na Savile Row, número 3, John leu uma reportagem da Melody Maker, escrita pelo DJ John Peel, questionando por que os Beatles estavam agindo como comerciantes de rou­pas e não músicos. Na mesma hora, ele mandou fechar a loja, para espanto de Lyndon. Na noite anterior ao fechamento, os membros da banda apareceram com suas mulheres e levaram tudo que queriam. No dia seguinte, 31 de julho de 1968, correu a notícia de que tudo que sobrara seria distri­buído gratuitamente. Uma multidão bai­xou na butique e a deixou vazia. “O concei­to da loja era muito melhor que a realidade”, George afirmou após o fracasso do empreen­dimento. “Era fácil ficar sentado pensando em ideias bacanas, mas transformá-las em realidade era outra coisa. Não deu certo por­que não éramos empresários. Só entendía­mos de ficar no estúdio fazendo música.” Paolo Hewitt.

2 comentários:

Valdir Junior disse...

Imagino o alvoroço que dever ter sido isso naquela Londres sisuda e careta. Adoro a arte desse The Fool.

João Carlos disse...

Que melada da prefeitura de Londres.